V Seminário Educação, Políticas
Públicas e Pessoas com deficiência.
Exclusão, Deficiências, Direitos Humanos: Novas Cartografias São
Possíveis?
Mesa-redonda: Diversidade e Cidadania: afinal a efetivação dos
direitos sociais garante a inclusão social?
A EXPERIÊNCIA DO CAP-BH
Elizabet Dias de Sá
Gerente de Coordenação do Centro de Apoio Pedagógico às Pessoas
com Deficiência Visual de Belo Horizonte - CAP-BH
mailto:elizabet.dias@terra.com.br
http:www.lerparaver.com/bancodeescola
INTRODUÇÃO
As primeiras iniciativas de escolarização de pessoas cegas na
sociedade datam do Séc. XIX com a fundação, do Instituto dos Meninos Cegos em
Paris que deu origem a criação de instituições similares na Europa, nos Estados
Unidos e no Brasil.
Um reflexo desse movimento foi a criação do Instituto Benjamim
Constant, em 1854, no Rio de Janeiro e do Instituto São Rafael, criado em 1926,
em Minas Gerais. A
estas instituições era
delegada a educação
integral de crianças
e jovens que
se deslocavam de grandes distâncias e perdiam o convívio
com suas
famílias e o contato
com suas
comunidades de origem.
Esse contexto
contribuiu significativamente para difundir concepções errôneas acerca
da falta da visão
com a disseminação
de mitos e estereótipos.
Até a década de 1980, prevaleceu a
medicalização das deficiências e as
abordagens assistencialistas e filantrópicas. Não
se cogitava a possibilidade de inserção
desses indivíduos em
escolas regulares
ou em
postos de trabalho,
a não ser em situações particulares e excepcionais.
Tradicionalmente, as pessoas
cegas eram encaminhadas para
desenvolver alguma atividade ocupacional
como fabricantes
de vassouras, vendedores
de loteria e outras atividades
como ambulantes
ou músicos amadores. Em decorrência, uma parcela
mínima destas pessoas
conseguiu ingressar em
setores produtivos
trabalhando de forma regular
e contínua.
A partir da Constituição
Federal e do conjunto
de leis que
se sucederam nas duas últimas décadas e
da revolução tecnológica
esse cenário
passou por uma expressiva
transformação com ênfase
no protagonismo das pessoas com deficiência
numa perspectiva de sujeitos
de direito e não
mais de objeto
do assistencialismo e da filantropia. Entretanto, Os dispositivos legais e os
avanços tecnológicos da atualidade por si só não asseguram o protagonismo e o
“empoderamento” destas pessoas. É necessário que se desenvolvam ações
afirmativas e políticas públicas que concretizem seus direitos por meio de
investimentos, projetos e outras iniciativas de forma articulada e consistente.
A IMPLANTAÇÃO DO CAP-BH
O desempenho
de atividades profissionais
e o atendimento educacional de pessoas cegas e com baixa visão
demandam a provisão, manutenção
e disponibilidade de recursos, serviços, materiais
e equipamentos que
possibilitem o acesso ao conhecimento, à
informação, à comunicação
e às tecnologias disponíveis.
Neste sentido, a formação, o investimento tecnológico, a criação de ambientes
acessíveis, o desenvolvimento de projetos e pesquisas são indispensáveis para a
remoção de barreiras físicas e de atitudes na perspectiva de uma educação de
qualidade para todos. É neste contexto que se insere a implantação
do Centro de Apoio
Pedagógico às Pessoas
com Deficiência
Visual de Belo
Horizonte - CAP/BH, em parceria com o Ministério da Educação
- MEC / SEESP e a Associação Brasileira de Educadores
de Deficientes Visuais
– ABEDEV. O CAP/BH tem como finalidade a inclusão de pessoas com deficiência visual
no sistema educacional
e nos demais
setores da sociedade.
A implantação do CAP-BH se deu a partir da doação de equipamentos,
do provimento de recursos materiais, da capacitação da equipe de trabalho bem como da liberação e
reforma do espaço físico, instalação do mobiliário, de computadores com
programas leitores de tela e sintetizadores de voz, impressoras braile e de
outros recursos tecnológicos. Os componentes da equipe de trabalho fazem parte
do quadro efetivo
da Prefeitura.
OBJETIVOS
* Garantir aos educandos cegos e aos de baixa
visão da rede
regular de ensino
o acesso aos recursos
tecnológicos e ao apoio
pedagógico necessários
ao seu desenvolvimento
educacional.
* Promover a formação em serviço e a
qualificação profissional dos servidores cegos
e com baixa
visão aprovados
em concurso público no âmbito
da rede municipal de educação
* Produzir textos e livros
em braile e ampliados.
* Confeccionar e adaptar materiais didáticos pedagógicos.
* Estimular, apoiar e promover
a formação dos educadores,
qualificando-os para o atendimento às necessidades educacionais
específicas de alunos cegos e com baixa visão.
* Apoiar e realizar
eventos, projetos e outras ações políticas, culturais e educativas que visem a
inclusão escolar e social da pessoa cega ou com baixa visão.
* Promover intercâmbio com outros CAPs
e organizações governamentais
e não-governamentais, locais, nacionais e internacionais
que atuem direta
ou indiretamente
na área da deficiência
visual.
AÇÕES E PROJETOS EM
DESENVOLVIMENTO
A partir da inauguração do CAP/BH, em agosto de 2003, realizamos
um levantamento do número de profissionais e de educandos cegos e com baixa
visão no âmbito da rede municipal de educação com o objetivo de analisar a
demanda, planejar as atividades e os projetos
a serem desenvolvidos. Para isto, foram
realizadas ações tais como:
Conferência da relação de alunos com deficiência visual
matriculados em escolas da rede municipal de educação e cadastrados no
Ministério da Educação;
Relação de professores cegos fornecida pela
Gerência de Pessoal
da Secretaria Municipal de Educação;
Identificação dos alunos com deficiência visual
realizada pelas professoras das salas de
recursos, junto
às escolas municipais de ensino regular;
Ofício do CAP/BH para as escolas municipais contendo os procedimentos e
encaminhamentos preliminares;
Divulgação das atividades
realizadas pelo CAP/BH.
As 182 escolas municipais
apresentam um contingente
de 143 alunos com
perda significativa
da visão, matriculados em 59 unidades escolares de educação
infantil, do ensino fundamental,
do ensino médio e da educação de jovens e adultos. Além destes alunos, foram
cadastrados 08 professores, uma auxiliar de biblioteca, uma auxiliar de
secretaria, 15 estudantes oriundos de escolas da rede pública estadual, de uma escola particular e da comunidade.
A maioria destes alunos encontra-se em uma situação
desfavorável em
termos de escolarização, de assistência na área
da saúde e não
dispõe de recursos materiais
ou de auxílio
ópticos necessários
ao seu desenvolvimento
ou reabilitação
visual. Na escola,
os professores não
compreendem as oscilações e necessidades decorrentes da limitação
visual. Em
muitos casos,
não foram alfabetizados apesar de cursarem o segundo
ou terceiro
ciclo de escolarização. As famílias destes alunos,
em geral,
vivem em situação
de pobreza e de desagregação
familiar;sobrevivem por
meio de benefícios,
sem uma renda
fixa ou
emprego estável.
Alguns usuários do CAP/BH, adultos, alfabetizados e com
diferentes níveis
de escolaridade assinavam através da impressão
digital. Para
eles, as pessoas
cegas que
não assinam são
tratadas como se fossem analfabetas e
passam por situações
de constrangimento no momento
em que
vão abrir uma
conta ou um crediário ou quando não conseguem dar um autógrafo, assinar uma lista de presença, o comprovante
de matrícula, firmar
um contrato
entre outros
atos de rotina.
Esta constatação deu origem ao Projeto Assino em Baixo http://www.lerparaver.com/bancodeescola
O ensino
da assinatura baseia-se em uma metodologia
aberta, flexível
e individualizada por meio da qual se
aprende a escrever o nome
por extenso,
a rubricar e a usar um marcador ou guia
confeccionado para este
fim. Consiste em uma interação positiva
centrada nos conhecimentos prévios, interesses, motivações e experiências
individuais na qual se valorizam o universo tátil e a expressão corporal.
A importância do ato de assinar costuma passar despercebida ou ser
negligenciada durante a infância ou a juventude das pessoas cegas talvez pelo
fato de elas ainda não se confrontarem com as exigências e responsabilidades
inerentes à vida adulta. Este projeto
contribui para a emancipação,
independência, auto-estima, afirmação de identidade
e de cidadania.
O CAP/BH mantém uma Escola de
Informática e Cidadania
– EIC em parceria com o Comitê de Informática e Cidadania – CDI/SUCESU/MG. A
EIC foi inaugurada em abril de 2005 com o objetivo de promover a inclusão
digital e ampliar as possibilidades de inserção de pessoas cegas no sistema educacional
e no mundo do trabalho.
Começou a funcionar em maio de 2005 com 04 turmas e um total de 32
alunos cuja faixa etária é de 16
a 60 anos. A maioria deles interrompeu o percurso de
escolarização durante o ensino fundamental ou após o término do ensino médio e
apenas dois concluíram o curso superior. A minoria trabalha como telefonista,
auxiliar de radiologia, músico e massagista sem vínculo empregatício, sendo que
14 recebem pensão ou benefício de prestação continuada.
Alguns destes alunos participam de programas de qualificação
profissional, de um coral, de atividades esportivas ou ocupacionais.
Existe, ainda, um contingente de 45 pessoas com perfil semelhante
no aguardo de novas vagas para a EIC.
O uso dos meios informáticos contribui para retirar estas pessoas
do anonimato ou da situação de isolamento, possibilita o acesso à sociedade da
informação e abre perspectivas mais favoráveis de inserção social.
A revolução tecnológica ocasiona a criação
de um conjunto
de recursos e ferramentas
que minimizam Ou
compensam as restrições decorrentes da falta da visão.
É o caso, por exemplo, dos softwares com leitores de tela e sintetizadores de
voz que possibilitam a edição de textos, a leitura sonora de livros
digitalizados, o uso do correio eletrônico, a participação em chats, a
navegação na Internet etc. Por outro lado, no Brasil, as pessoas com
deficiência não contam com subsídios ou ajudas técnicas para aquisição de
equipamentos. Além disso, enfrentam barreiras de acessibilidade
física e virtual
porque as alternativas
disponíveis são
pouco conhecidas e difundidas.
NECESSIDADES E DESAFIOS
* ampliação da equipe de trabalho com o objetivo de expandir o
atendimento e o apoio didático-pedagógico ao alunado com baixa visão;
* provisão de recursos materiais e aquisição de novos equipamentos
* investimento na formação
continuada e em serviço
para fazer frente às demandas
e necessidades específicas dos usuários do CAP/BH e dos profissionais
da educação
* estabelecimento de uma política
unificada e coesa entre os diversos setores
da Prefeitura visando assegurar
o acesso aos meios
informáticos disponíveis e a inclusão digital no ambiente escolar
e de trabalho no âmbito
da rede municipal de educação.
* contratação de dois digitadores para dinamizar a produção braile
contratação de novos educadores para a Escola de Informática e
cidadania
·
ampliação do espaço físico do
CAP/BH
CONCLUSÃO
A partir desta experiência, o que
se confirma é a dura constatação de que “Prevalece o abismo entre leis
generosas e sua falta de aplicação, os poucos avanços efetivos deram-se por
pressão da sociedade civil. Quanto aos direitos sociais, nem se fale! O Brasil continua
sendo um dos países de maior desigualdade social do planeta”, conforme
observação do procurador da república José Damião de Lima Trindade em uma
entrevista publicada na Revista do
Terceiro Setor em 20 de junho de 2002.