NCE/UFRJ CONSUMIDOR ALERTA





           DO FINANCIAMENTO NAS COMPRAS A CRÉDITO:


           AUTORA: CLÁUDIA MARIA LAZZARINI.


   As compras a crédito, na verdade, são constituídas de dois contratos distintos, que, em conjunto, integram um único negócio jurídico, que é a aquisição de algum produto no sistema de crediário.


   Estes contratos que integram a compra a crédito são o contrato de compra e venda propriamente dito, que se completa com a transferência do bem adquirido, do vendedor para o comprador, e o contrato de financiamento, onde existe uma instituição financiadora, como banco ou financeira, que efetua o pagamento do valor do produto adquirido pelo consumidor diretamente e à vista ao estabelecimento comercial no qual o consumidor realizou a compra do produto, se transformando na detentora da dívida do consumidor. Este instituto jurídico é denominado de outorga de crédito.


   Com isso, o estabelecimento comercial vende o produto e recebe todo o montante do agente financiador, exceto a comissão ou porcentagem cobradas por esta instituição financeira para a realização do financiamento, e, consequentemente, o agente financiador se torna o verdadeiro credor do adquirente do bem, o qual, não mais deve à empresa onde comprou o bem, e sim, ao agente financiador.


   Daí a necessidade de analisarmos separadamente os dois contratos diferentes embutidos nestes tipos de compra de produtos, no que diz respeito a alguns aspectos, principalmente, em relação aos vícios apresentados pelo produto adquirido mediante uma compra a prazo, e ao pagamento desses bens. Por outro lado, analisaremos em conjunto os referidos contratos que constituem a compra no crediário, no que tange ao cancelamento da compra, devido a vícios no produto adquirido.


   Então vejamos: No caso de um consumidor adquirir um produto em uma loja mediante outorga de crédito, e o bem comprado vier a apresentar vícios, mesmo que tais defeitos sejam de grande extensão, e que o bem permaneça por um longo período na assistência técnica, sem que o vício tenha sido sanado, não é aconselhável que o consumidor interrompa o pagamento das prestações vencidas, em nenhuma hipótese e sob nenhuma circunstância, visto que, ao contrário do que muitos imaginam, o estabelecimento que vendeu o bem não será penalizado com a suspensão dos pagamentos por parte do adquirente, já que a firma vendedora já recebeu todo o dinheiro correspondente à mercadoria vendida. Neste caso, o consumidor ficará inadimplente junto ao agente financiador, que poderá, inclusive, cobrar juros de mora e multa por atraso do devedor e incluir seu nome nos cadastros de inadimplentes, como SPC e Cerasa, desde que avise previamente e por escrito ao consumidor acerca desta inclusão, como dispõe o artigo 43, § 2º do código de proteção e defesa do consumidor. Por esta razão, aconselhamos que o consumidor, no caso de vícios no produto adquirido através desta forma de compra, tente solucionar seu problema no que toca ao vício junto à empresa que lhe vendeu o bem, mas, sem suspender ou atrasar as quitações das parcelas do financiamento. Cabe ainda ressaltar que, a sustação de cheques sem um motivo justificável, como furto, roubo ou estravio, devidamente comprovado, constitue crime de estelionato, previsto no artigo 171 do código penal brasileiro.


   No que concerne ao cancelamento da compra em razão de vícios do produto ou não cumprimento da oferta por parte da empresa vendedora, com fulcro nos artigos 18, § 1º, II; § 3º e § 6º III, artigo 26, § 3º e artigo 35, III, todos do código do consumidor, a quantia despendida pelo consumidor, na aquisição do produto em questão, deverá ser restituído ao adquirente, acrescido das devidas atualizações monetárias, diretamente pela empresa vendedora, ou, em última análise, pelo fabricante do produto defeituoso, mediante a devolução da mercadoria viciada por parte do consumidor, e não pelo agente financiador, que terá que ser restituído pela empresa que comercializou o bem viciado, no tocante a qualquer quantia que, por ventura, tiver desembolsado a título de pagamento adiantado ao comerciante vendedor.


   Por seu turno, os juros provenientes do financiamento ou de um eventual atraso, por parte do consumidor no adimplemento das prestações constantes da venda a crédito, pertencem ao agente financiador, posto que a firma vendedora, recebe da instituição financeira que se sub-roga no crédito do consumidor apenas o valor a vista do bem comercializado, por que recebe toda esta importância de uma só vez do agente financiador.


   Desta forma, o consumidor que teve, por algum motivo, que arcar com o pagamento de juros moratórios, e obteve o cancelamento de sua compra, por causa de vícios no produto adquirido, deverá cobrá-los diretamente do agente financiador, que foi quem efetivamente os recebeu. É importante também se ressaltar que os juros cobrados pelos agentes financiadores são bem mais elevados que aqueles exigidos quando o comerciante realiza um crediário próprio, visto que são baseados na taxa básica de juros, que, atualmente, é de desesseis e meio por cento ao ano e onera muito os financiamentos das compras a prazo. Hoje em dia, quase todo o comércio trabalha com suas vendas em parceria com os agentes financiadores, sendo raros os crediários próprios, em razão da grande inadimplência que assola o mercado de consumo.


   Por outro lado, os consumidores que se tornam inadimplentes em relação às parcelas de seus financiamentos, não podem ter seus bens adquiridos pelo sistema de crediário apreendidos pelo comerciante vendedor e nem pelo agente financiador, ou retirados contra a sua vontade de sua posse, mesmo que a inadimplência perdure por um longo período de tempo, excluindo os casos de mandado judicial, expedido em ação própria, nos contratos de financiamentos realizados através de alienações fiduciárias, cabendo apenas ao agente financiador cobrar o devedor em juízo.


   Por derradeiro, é excencial salientar que o consumidor deverá ser sempre informado, antes de adquirir qualquer produto, pelo sistema de compra a prazo, sobre as condições de pagamento, número de parcelas a serem quitadas no financiamento, valor de cada prestação do contrato, juros a pagar e descontos que o adquirente terá no caso de efetuar a liquidação total antecipada do contrato, no que toca aos juros, etc. Enfim, o consumidor deve ser previamente informado em relação a todos os temas que integram o seu financiamento, de maneira clara, precisa, concisa e de modo que o adquirente do bem possa compreender com exatidão os termos de sua compra, como preceitua os artigos 30, 31 e 52 e seus incisos, todos do código do consumidor. O desconto a ser oferecido ao consumidor quanto aos juros, na hipótese de quitação antecipada de todo o financiamento, deve ser proporcional ao período de adiantamento de cada parcela a vencer paga antecipada, como prevê o artigo 52, § 2º do CDC. O preço do produto a ser adquirido deve estar expresso em moeda corrente nacional. Também deve ser informado ao consumidor o montante dos juros de mora e da taxa efetiva anual de juros do contrato, bem como os demais acréscimos legalmente previstos. É de suma importância que o adquirente tenha plena ciência sobre o número e a periodicidade das parcelas a pagar, assim como a soma total a ser quitada, com e sem o financiamento. As multas moratórias não poderão exceder ao limite de dois por cento do valor da parcela vencida, em se tratando de contratos que envolvam outorga de crédito ou concessão de financiamento ao consumidor, como ocorre com as compras a prazo, como dispõe o § 1º do artigo 52 do CDC. Por fim, deve-se dizer ainda que, tudo o que foi explanado neste texto, além de valer para a compra de produtos, é aplicável também para a contratação de serviços. Em se tratando de alienação fiduciária, é nula a cláusula contratual que dispuser que o consumidor perderá todo o valor já pago, caso a compra for desfeita e o bem retomado pelo credor, previsão esta contida no artigo 53 do CDC.


   Em síntese, o consumidor deve ficar bem atento quando for adquirir algum produto mediante financiamento, para que não seja lesado ao contratar esta forma de aquisição de bens, e, caso tenha qualquer dúvida, deverá procurar o procon, a fim de que possa ter sempre os seus direitos de consumidor e de cidadão respeitados em sua plenitude, posto que na relação de consumo, é a parte hipossuficiente, ou seja, a parte mais fraca no mercado consumerista, para que, desta maneira, possa ser alcançada a busca constante da verdadeira justiça.



           CLÁUDIA MARIA LAZZARINI


   04 DE FEVEREIRO DE 2004


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