Presentes

Aproxima-se o Natal, aquela data em que toda a humanidade se une num único sentimento, o de ambiguidade com a obrigação de dar presentes. Já que, se por um lado dar é a única maneira de receber presentes no Natal, por outro lado escolher o presente certo para dar, todos os anos, é um desafio à imaginação e à paciência. Principalmente presentes para crianças em idade pre-eletrônica e velhos em idade pós bebida alcóolica. Velhos geralmente ganham meias. Antes ganhavam gravatas, loções de barbear ou carteiras, quando achavam que eles ainda saíam de casa, precisavam cheirar bem e tinham uma vida econômica. Depois meias, e daí para a frente só meias, progredindo para um último estágio antes de não receber mais nada, que é o das meias de lã. Mas existem, sim, presentes para velhos que já passaram o patamar da lã. São as caixinhas para remédio. Você sabe que entrou numa fase especial da existência quando seus presentes se dividem entre meias de lã e estojos para as suas pílulas. Quando ninguém tem mais dúvidas de que sua principal preocupação na vida, além dos pés quentes, é ter seus remédios todos juntos, e à mão. As caixinhas para remédios têm um significado simbólico. Fecham um ciclo. Na nossa primeira infância não nos interessávamos muito pelos nossos presentes e sim pelas suas embalagens. Muitas vezes o carrinho de corrida era atirado longe e brincávamos com a caixa em que ele viera —como se ela fosse um carrinho de corrida, claro. A caixinha para remédios é a embalagem que recupera seu prestígio conosco. Ganhar uma caixinha para remédios na velhice é como ganhar só a caixa, sem o brinquedo, na infância. Também desdenhamos do conteúdo, valorizando o invólucro, mas desta vez não é irracionalidade infantil, é fingimento. Não sei se existe uma relação direta, mas quanto mais ornamentada a caixinha (quadrada, redonda, oval, funcional, florentina) mais forte os remédios que ela carrega e mais crítica a saúde do portador. O objetivo da caixinha incrementada é desviar a atenção do remédio para uma bijuteria. O objetivo é nos consolar. É todos nos invejarem por precisarmos tantos remédios. Já existem caixinhas para remédio musicais. Aí, claro, é preciso ter um certo cuidado na escolha da música que toca quando se abre a caixinha. Nada muito frívolo, mas também nada muito funéreo.


Envie carta para VINI E JOBIS

Copyright (c) 2000 - >Esta página foi gerada através do Intervox, mais um utilitário de rede do Projeto DOSVOX Contacte o coordenador do Projeto