ENTREVISTA COM TOLKIEN

Material retirado de:

Um tributo a J. R. R. Tolkien

ENTREVISTA COM JOHN RONALD REUEL TOLKIEN

Entrevista de Tolkien realizada em 1971 para a rádio BBC de Londres, programa "Now Read On". O entrevistador foi Dennis Gerrolt. Confira como foi:

Tradução feita por: Eärendil

Gerrolt - Então você teve algum tipo de esquema com o qual era possível trabalhar? Tolkien - Imensas sagas, sim... O Hobbit foi sugado de minha mente, O Hobbit originalmente não fez parte disso, mas foi se movendo para fora do mundo e criando suas próprias atividades.

Gerrolt - Então seus personagens e sua história realmente tiveram uma carga. Tolkien - [Acende seu cachimbo]

Gerrolt - Eu disse carga, não quero dizer que você estava completamente envolvido pela magia ou qualquer coisa assim... Tolkien - Oh, não, não, eu não fico divagando com isso, de qualquer forma isso não é uma obsessão. Você tem essa sensação que dos pontos A, B, C, D e só A ou um deles está certo e você tem que esperar até ver que está correto. Eu tive mapas, claro. Se você cria uma história complicada, você precisa trabalhar em um mapa caso contrário você nunca poderá criar mapas depois disso. As luas eu pensava que estavam fora de acordo com o pôr-do-sol. Colocava um pôr-do-sol e quase ao mesmo tempo um amanhecer. Tive problemas com isso.
       [larga o cachimbo]

Gerrolt - Você começou a escrever no ano de 42? Tolkien - Oh não, eu comecei assim quando terminei O Hobbit - nos anos 30.

Gerrolt - E estava pronto muito antes de ser publicado... Tolkien - Eu escrevi o último... perto de 1949 - lembro que lamentei ter parado. Entretanto, foi um tremendo trabalho de revisão. Datilografei todo aquele trabalho duas vezes, em uma cama no sótão. Não pude dispor de um datilógrafo. Há alguns enganos também e me divirto em dizer agora quando estou em uma posição onde não importa o que as pessoas pensam de mim - que havia alguns erros assustadores na gramática, dos quais um Professor de Língua Inglesa e Literatura ficaria chocado.

Gerrolt - Não fui noticiado de algum deles. Tolkien - Havia um onde eu usei bestrode como o particípio passado de bestride! [gargalhadas]

Gerrolt - Você sente algum remorso como um filólogo, como Professor de Língua Inglesa, quando você estava preocupado com a criação de idiomas e dedicou grande parte de sua vida a uma coisa fictícia? Tolkien - Não. Tenho certeza de ter terminado com o idioma muito bem! Há muita sabedoria lingüística nelas. Eu não sinto algum remorso ou complexo em relação ao O Senhor dos Anéis.

Gerrolt - Você tem uma afeição particular pelas coisas confortáveis da vida dos Hobbits no Condado: a casa, o cachimbo, a lareira? As simples virtudes? Tolkien - E você não tem?

Gerrolt - Você não tem Professor Tolkien? Tolkien - Claro que sim.

Gerrolt - Você tem então uma afeição particular pelos Hobbits? Tolkien - Isso porque me sinto como eles em casa. O Distrito é muito parecido com o mundo no qual me dei conta primeiro de coisas que eram, talvez, mais importantes para mim. Eu não nasci aqui, eu nasci em Bloomsdale, na África do Sul. Eu era muito jovem quando voltei, mas isso morde sua memória e a imaginação se você não pensa que tem. Se sua primeira árvore de Natal é um eucalipto murchando e se normalmente está aborrecido pelo calor e areia você procura por um abrigo - então, quando tem uma certa idade, a imaginação se revela e de repente você se acha em uma silenciosa vila de Warwickshire, eu penso que isso gera um amor particular pelo que você poderia chamar as terras centrais de Midlands (uma zona rural inglesa), baseado em água boa, pedras e árvores de olmo e pequenos rios silenciosos e assim por diante. E, claro, sobre as pessoas rústicas.

Gerrolt - E qual era sua idade quando veio para a Inglaterra? Tolkien - Eu suponho que aproximadamente três anos e meio. Bem pungente, claro, que algumas pessoas dizem não se lembrarem das coisas quando jovens. Mudanças e desprezo simplesmente criam um obscurecimento. Mas se uma criança de repente quebrar isso, está consciente e o que se tenta fazer é ajustar as novas memórias sobre as pessoas velhas. Eu tenho um quadro perfeitamente claro e vívido de uma casa que eu sei é de fato minha própria casa em Bloemfontein e a casa de minha avó em Birmingham. Eu ainda lembro que desci a estrada de Birmingham e desejando saber o que aconteceu com a grande galeria, o que aconteceu com a sacada. Por conseqüinte, ainda lembro extremamente bem das coisas, eu posso lembrar de tomar banho no Oceano Índico quando eu não tinha mais do que dois anos e lembro disso muito claramente.

Gerrolt - Frodo aceita o fardo do Anel e ele encarna um personagem com virtudes de um longo sofrimento e perseverança e pelas suas ações poderia-se dizer que existe quase um senso budista com ele adquirindo o mérito. Ele se torna de fato quase uma figura de Cristo. Porque você escolheu um anão, um hobbit para esse papel? Tolkien - Eu não escolhi. Eu não tive muita escolha, eu escrevi O Hobbit, você pode ver... tudo que eu tentava era fazer uma continuação do ponto onde O Hobbit terminou. Os hobbits já estavam nas minhas mãos, não tive escolha.

Gerrolt - Realmente, mas não há nada particularmente da figura de Cristo sobre Bilbo? Tolkien - Não...

Gerrolt - Mas em face ao mais apavorante perigo ele luta, continua, e por fim vence. Tolkien - Mas isso parece, eu suponho, mais como uma alegoria da raça humana. Eu sempre fui impressionado pelo fato que nós estamos aqui sobrevivendo por causa da coragem indomável de pessoas bastante pequenas contra as coisas estranhamente impossíveis: florestas, vulcões, feras selvagens... eles continuam lutando, quase que cegamente.

Gerrolt - Eu pensei que metaforicamente Midgard poderia ser a Terra-Média ou teria alguma conexão? Tolkien - Ah sim, eles são as mesmas coisas. Muitas pessoas têm cometido esse erro pensando que a Terra-Média é um tipo particular da Terra ou outro tipo de planeta de ficção científica mas é apenas um antigo nome para este mundo que nós vivemos, cercado pelo Oceano.

Gerrolt - Parecia a mim que a Terra-Média era de certo modo como este mundo que vivemos, mas em uma era diferente. Tolkien - Não... mas em um estágio diferente da imaginação, sim.

Gerrolt - Você pretendia em O Senhor dos Anés que certas raças deveriam ter certos princípios: a sabedoria dos Elfos, a habilidade dos Anões, a força dos Homens e assim por diante? Tolkien - Eu não pretendi isto, mas quando você tem essas pessoas em suas mãos, você tem que os fazer diferentes. É bem claro que como sabemos no final das contas todos nós conseguimos que a humanidade desse certo, é só o barro que nós temos. Nós todos - ou pelo menos uma grande parte da raça humana - gostamos de ter grande poder da mente, grande poder da arte e o que eu quero dizer é que o buraco entre a concepção e o poder da execução poderia ser encurtado... Porém, nós deveríamos gostar mais de tempos mais longos e indefinitivos onde nós poderíamos saber mais e criar mais. Por isso, de certo modo, que os elfos são imortais. Quando uso a palavra imortalidade, eu não quero dizer que eles são eternamente imortais, apenas que são provavelmente imortais e sua longevidade tem seu contato com a habitabilidade da terra. Os Anões, é claro são bastante óbvios - você não diria que de vários modos eles te lembram dos Judeus? As palavras deles são semíticas obviamente, construídos para ser semíticas. Os hobbits são só um povo rústico Inglês, feitos em pequenos tamanhos porque reflete (em geral) o pequeno alcence da sua imaginação - não o pequeno alcance da coragem ou poder oculto.

Gerrolt - Isso parece ser uma das grandes forças do livro, essa enorme conglomeração de nomes - o leitor não se perde, pelo menos após a segunda leitura. Tolkien - Estou muito contente por você ter me tido isso, porque tive muitos problemas. Também tenho um grande prazer em criar nomes, um bom nome. Eu sempre começava com um nome. Dê-me um nome e termino uma história com ele, normalmente não faço de outro modo.

Gerrolt - Dos idiomas que você tem conhecimento, qual foi de maior ajuda para você durante o desenvolvimento de O Senhor dos Anéis? Tolkien - Oh lor... das linguagens modernas eu deveria dizer que o galês sempre me atraiu, pelo seu estilo e som, mais do que qualquer outro, entretanto só o vi primeiro em caminhões de carvão, eu sempre quis saber o que aquelas elas palavras significavam.

Gerrolt - Parece a mim que a música do galês tem a participação nos nomes que você escolheu para as montanhas e outros lugares em geral. Tolkien - Muito. Mas muito raro, a influência mais potente em mim foi o Finlandês.

Gerrolt - O livro pode ser considerado como uma alegoria? Tolkien - Não. Eu repugno a alegoria sempre que sinto seu cheiro.

Gerrolt - Você considera o declínio do mundo na Terceira Era em seu livro... E você vê a Quarta Era como o mundo atual, o nosso mundo? Tolkien - Na minha idade eu sou exatamente a mesma pessoa que viveu muito depressa por muitos períodos variáveis da história. Seguramente, eu nunca poderia prever tantas mudanças em setenta anos.

Gerrolt - Há uma qualidade outonal ao longo de O Senhor dos Anéis, num caso um personagem diz que a história continua mas eu pareço ter perdido o rumo dela... porém, tudo está em declínio, enfraquecendo, pelo menos para o final da Terceira Era, qualquer escolha tende a se transformar em alguma tradição. Agora isto parece a mim ser um pouco como Tennyson "a velha ordem dá lugar a uma nova e a vontade de Deus se cumpre em muitas formas". Onde está o Deus em O Senhor dos Anéis? Tolkien - Ele é mencionado, uma ou duas vezes.

Gerrolt - Seria ele o Um...? Tolkien - O Um, sim.

Gerrolt - Você é um ateísta? Tolkien - Oh, eu sou um Católico Romano. Devoto Católico Romano.

Gerrolt - Você deseja ser lembrado principalmente por suas escritas de filologia e outros assuntos ou por O Senhor dos Anéis e O Hobbit? Tolkien - Eu não pensei muito nesse assunto - se eu for lembrado pelo O Senhor dos Anéis, eu aceito. Não espero que seja como no caso de Longfellow, as pessoas lembram que ele escreveu Hiawatha, mas esqueceram totalmente que ele era um Professor de Idiomas Modernos!


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