Jornal Correio da Paraíba


  João Pessoa - domingo, 05 de agosto de 2001


Luiz Augusto Crispim


Imagens de família


    - Mãe, quero almoçar na televisão.

A vontade do menino, decretada em tom inapelável, produz seus jurídicos e legais efeitos.

E o garoto almoça diante da telinha, na conformidade do seu agrado. É o império do desejo massificado pelo poder legislativo da TV.

O pátrio poder dos pais de quase nada serve. Quem manda é a Shenia ou a Xuxa, conforme o mando do horário. E estamos conversados.


    Almoçar à mesa é uma novela.

Os meninos alegam que não tem graça, que vão perder o episódio do dia de Hércules pi então, simplesmente, que está na hora de Angélica sorrir...

E não adianta a mãe fazer cara feia, pois é o sorriso de Angélica que prevalece.

Como na cançoneta de Chico, a única coisa que restou foi a lembrança escrita em cima que era um lar.


    Na prática, ganha a TV.

Eles querem almoçar, jantar e viver na televisão, mas se contentam em existir diante da sua luminescência bruxuleante, acendendo e apagando os seus neurônios feito pirilampos eletrônicos nas trevas da modernidade.

Aquele estilo patriarcal da mesa posta, o dono da casa sentado à cabeceira, a família toda em derredor, esperando que o pai sorvesse a primeira colher de sopa - esse velho seriado já não se exibe mais. Por falta de público.


    Nem mesmo em reprise.


    Acabou.

Os meninos, agora, tomam o desjejum em companhia de Angélica, almoçam com Xuxa, e vão para a cama com a imagem da Tiazinha na cabeça. No meu tempo de menino, a gente ia dormir apenas com um sonho de mulher na imaginação.

Mas o pior é que os adultos acabaram também ficando sozinhos. E fogem da mesa com seus pratos solitários contrabandeados para o mundo das ilusões que ardem na lareira da televisão.


    Ninguém se encontra mais em casa. A TV esvaziou o lar.

E como lá dentro não há mais ninguém, as pessoas esqueceram de vez de se visitar. Nem vale a pena bater à porta. Quando muito, assomará diante do eventual visitante uma personagem de ficção.

Que, certamente, nenhum de nós reconhecerá pelo nome. A não ser que contracene com alguém da novela das oito...


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