João Pessoa - quinta-feira, 21 de junho de 2001

Luiz Augusto Crispim

Segredos ao mar

Uma carta de amor veio dar à praia. O estafeta ocasional aceitou o improviso e foi levá-la ao endereço indicado pelo signatário. No destino, uma mãe de olhos marejados e uma mulher de olhar perdido no cais da solidão.

A história deu manchete no noticiário nobre da TV e agora rende suspiros ao cronista perplexo com a lembrança do marinheiro e sua correspondência à moda antiga.

Cartas de amor postadas em alto mar sempre rendem inevitáveis crônicas, sonetos alexandrinos e até canções apaixonadas. Em tempos de links diretamente abertos para as janelas universais da Internet, esse tipo de correio é mesmo surpreendente.

Que espécie de segredo será esse que o moço teria para transmitir em sua mensagem náutica? Por certo, algo que as teclas do computador de bordo não podiam segredar. Muito menos aquele alforge do carteiro, atulhado de vidas sobrescritas seria capaz de guardar...

    Segredos confiados às ondas do mar.

Quando era menino, boquinha da noite, aqui mesmo, nestes domínios orientais do Atlântico, costumava frequentar as fronteiras úmidas das areias mornas do entardecer com o Reino das Águas quase anoitecidas.

Na minha cabeça, era o lugar certo para achar coisas incertas. Na hora aprazada pelo destino.

    Como no poema de Lorca, cinco en punto de la tarde...

Nunca tive a sorte de resgatar nada que merecesse um único verso, a não ser um anelzinho de pérola falsa, que reinou no dedo da namorada pelo tempo que durou a eternidade do nosso namoro adolescente.

É a hora certa de todos os destinos se cumprirem, de todas as coisas incertas chegarem ao seu destino. Inclusive as cartas de amor confiadas às ondas do mar.

Não sei precisamente a hora em que foi recolhida a garrafa contendo a mensagem lá de Camaratuba.

Tomara que tenha sido mesmo ao entardecer, fronteira das areias mornas a confinar com as águas tépidas do país dos sonhos. Só para não romper com as tradições dos amores segredados em mensagens náuticas de longo curso.