F. Pereira da Nóbrega |
A terra prometida
Ainda contam nos sertões a estória do coronel Veremundo.
Dava uma filha em casamento a quem quisesse trabalhar na sua fazenda, chamada Mocotó do
Pururu. Não é que a terra fosse má. É que não era qualquer das filhas que estava exposta em
casamento.
Tinha que ser Pafúncia, criatura sem cintura, feia de corpo, mais feia de nome. Parecia a Belém-
Brasília nos anos 60: comprida e mal-acabada. Onde estava, era uma poluição visual.
A estória termina, assegurando que findaram virgens a Pafúncia e a fazenda Mocotó do Pururu.
Os Estados Unidos estão oferecendo vantagens a quem quiser entrar na Alca. Não é que as
vantagens sejam poucas. É que esta Alca lembra a Pafúncia do Coronel Veremundo.
É comprida, mais que a União Européia. Está exposta em casamento para a América inteira, de
pólo a pólo.
Nem digamos que todo Mercado Comum tem que ser mau para seus participantes. É que a Alca,
além de cumprida, é mal-acabada. Seus primeiros delineamentos deixam entrever que os países
membros não terão autonomia de desenvolvimento. Nessa terra do Veremundo americano, em se
plantando, tudo dá. Mas só se planta o que Veremundo quiser.
Não digo que a Pafúncia de Bush deva ser rejeitada sob qualquer hipótese. As primeiras sugestões
de uma plástica geral já chegaram ao Coronel das Américas. Mas ele reluta.
Conversou com a Argentina. Dava-lhe um lugar no Conselho de Segurança da ONU. Assim matava
dois coelhos de uma só cajadada. Tirava o Brasil de assento neste Conselho - o que esta bem
encaminhado. E tirava a Argentina do Mercosul para a Alca - como intencionava.
Sem sua língua, mal se entende um povo. Sem a cultura de seus contemporâneos, pior se
entendem esses coronéis. Tanto o Bush como o Veremundo.
Que quiseram esses homens da era do coronelato? Quiseram um projeto para si, deserdando os
contemporâneos de todas as benesses do futuro. Que querem esses Veremundos dos States, sempre
com sonhos que envolvem o Continente mas quase só eles são agraciados?
Querem mais. Neste mundo é assim. Uns querem bem. Outros querem mais. Uns vêm para a
exploração, outros para o amor. Fico no meu cantinho, esquecido das Pafúncias deste mundo,
sonhando com uma solidariedade humana.