Leia crônicas de F. Pereira da Nóbrega

F. Pereira Nóbrega


Solidários por um dia

Muitos vivem do lixo, para sustento da vida. Há também um lixo humano, de milhões de marginais, vegetando nas favelas. Entre eles há filósofos, poetas, gênios da música, de artes plásticas. Num improviso criam a arte que o vento leva. Mestre Vitalino lembrava um Aleijadinho, trabalhando no barro. Dominguinhos era um menino do povo que Luis Gonzaga descobriu sanfonando, à beira de uma estrada. Há muito artista até entre marginais.

Os miseráveis remexem o lixo para a sobrevivência. A grande sociedade aumenta riquezas, remexendo o lixo humano. . Acharam um menino, marginal na favela, genial no cinema. No filme, o chamaram de Pixote. Foi sucesso no Brasil e no Exterior. Pensou-se que ele se redimira da miséria, graças a seu talento, sem dever favores. Depois, a imprensa deixou escapar. Pixote fora explorado pelo produtor da película. Deu-lhe uma ninharia. O menino era um marginal, logo qualquer dinheiro lhe bastava.

Foi um dia de gloria numa vida de cão. Pixote voltou à marginalidade de onde viera. Depois foi preso, como menor infrator. Voltava a praticar o que ensinara no cinema e aprendera na vida. Agora lá ia ele, exatamente como termina no filme: trilhando uma estrada de ferro.

Era de ferro o caminho que lhe restava. Andava por andar, sem família nem teto, sem ter para onde ir. A experiência fora grande para idade pequena. Nem idade nem experiência o ajudaram a trocar a estrada de ferro pelo asfalto. Nalguma periferia de SP, Pixote teria que novamente roubar para não morrer de fome. teria que condividir o roubo com a polícia para não morrer de bala. Nem assim escapou da bala que o matou.

Pensou ele q eu tinha se mudado da periferia para o centro. Apenas pegara uma carona, rodara um instante pelo mundo da glória para ser deixado novamente na lama de onde viera. Não é fácil um lugar entre os homens.

Lembro esse caso que conhecemos para julgarmos outros da mídia que fingimos desconhecer. Mostraram uma vez uma “viúva da seca”. Depois a mostraram coberta de favores que a sociedade, comovida, lhe dispensara. Mostraram um menino do sertão. Ossos de animais eram sua diversão. Mandaram-lhe centenas de presente E as demais viúvas das secas, demais crianças dos sertões que solução acharão? Todos pegaram carona, voltarão à miséria novamente.

Não aceito a solução para um, estampada na mídia, e a miséria para multidões escondidos na lama. Não aceite as caronas da solidariedade que dura um dia. Quero um mundo sem Pixotes e sem caronas.


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