F. Pereira da Nóbrega



Perdão: ter e dar

Não dê esmola apenas porque alguém a pede. Dê, se o outro precisar. Não dê perdão apenas porque alguém o implora. Dê porque, no caso, você é como o outro: também precisa. Digo: precisa dar. Quem de perdoar não precisa, ainda não sabe o que é errar

Mais difícil que aos outros é a si mesmo perdoar. Disso carece quem não se aceita. Assume a rejeição de si, duvida ser aceito pelos demais. Aceitar-se é autenticidade. É conjugar o verbo ser no reflexivo: se ser é se aceitar.

Não sou apenas meu corpo, meu físico. Sou também meu passado. Cravado sobre meus ombros, só ele não me passa. Fingindo por dentro ser dois, há gente que não se perdoa. De si é réu e juiz. O juiz que condena é nele o mesmo réu que implora não ser condenado.

Mas não se perdoe quem ainda não sente a vontade de voltar. Se ainda está indo, nas vias do próprio erro, aceita descaminhos e, neles, seus próprios passos. Nesses, a volta é precoce, na consciência que dói.

Mas quem já se pôs de volta, já redimiu metade do eu perdido. A outra metade ainda implora a perdição continuada. As pegadas da ida, quais covas de plantação, semearam passos de hesitação, de quem não quer e querendo. E nessa plantação, deitou raízes o passado.

Em cada tempo presente há raízes do passado. Assim, de uma única vez, ninguém se penitencia de todo. A gente se arrepende em módicas prestações desse viver precário. O arrependimento começa por não mais se achar doce o que já lhe sabe amargo. Mas, entre o ontem e o hoje, ainda pendula, cambaleia a vontade do retorno. Como o bêbado, de volta para casa. Só os pêndulos não hesitam entre ir e voltar.

O marinheiro, quando à terra desce, carrega no corpo o balanço do mar. É vontade de retorno? Se errar é humano, não menos humano é esta vontade de ao erro voltar.

Se, hoje, alguém lhe aparecer, lembrando o bêbado que não foi, imitando o marinheiro que não é, o pêndulo que jamais será, se quer e hesita em querer, não hesite você. Abrace-o. É pêndulo enlouquecido, hesitando ao pendular. É um ser humano. Como você, errou. Como você, deseja ser perdoado.


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