Leia crônicas de F. Pereira da Nóbrega



Liberdade de escravo

Por um desses acasos, telefonei pedindo táxi. Veio um, de um italiano. Conversamos, gostamos da conversa. Passou-me seu telefone. Ficou me prestando esse serviço.

A conversa subiu para os patamares da amizade. O homem começou a me falar de si. Perguntado por que deixou sua pátria, me dizia que queira ser livre. A mesma resposta para dizer por que se viciara na droga,bebia demais, trocava a noite pelo dia. “Liberdade é a melhor coisa da vida” – costumava me repetir.

Insistia que viver é uma só vez e não se pode perder um minuto do tempo que passa. Viver para ele era curtir o prazer, sem normas, sem dieta, sem medir consequências, sem moral. Não era original em sua filosofia de vida. Muitos dizem a mesma coisa. Muitíssimos, se assim não dizem, assim contudo fazem.

Meu amigo era escravo, se dizia livre. Per vez chorava, me contando as seqüelas de sua vida sobre seu lar. A droga o fazia ríspido, agressivo. Então maltratava esposa e filhas, esmurrava pessoas em casa. A embriaguês o tornava inconveniente, em palavras e gestos de convivência. Era quando me procurava, chorando, querendo recuar de seus hábitos. Queria, não conseguia mais. E continuava se dizendo livre.

Ele me consultava muito, me ouvia pouco. Faltava liberdade para atender ao amigo. Envolveu-se com polícia, andou preso. Novamente procurava dentro si um espaço livre onde não torturasse tanto a família. Procurava, não achava.

Um dia o aconselhei a voltar para sua terra. A parentela o apoiaria melhor do que nesse abandono de estrangeiro irregular perante as leis. Antes da partida, nos tornamos compadres e sua caçula, minha afilhada.

Agora me chega a notícia. Da Itália, minha afilhada treme a voz para dizer que seu pai morreu. Foi câncer generalizado, num corpo que a droga intoxicara. Tudo se revelou sem tempo de alternativas. Esposa e filhas, três, carecem de condições de sobrevivência na Itália, no Brasil ainda mais..

Perdoem-me jovens de todas as idades mas isso que hoje escrevo tem vocês por destinatários. Uma campanha de trânsito diz: “não corra, não mate, não morra”. Valha isso no trânsito da vida. Para que correr contra os valores de saúde, paz, de família? Para que se dizer livre quem usou de sua liberdade apenas para se tornar escravo?

Só vive bem quem bem administra a liberdade de viver.


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