Leia crônicas de F. Pereira da Nóbrega |
Guilhotina social
Algum tempo atrás, um Ministro da Saúde anunciava quantos milhares de crianças seguramente morreriam no Nordeste naquele ano. Parecia repórter anunciando gol. Para ele, tudo era natural como o ar que se respira. Outro Ministra da Saúde, gaúcho, anunciava a média de vida nos pampas: de 74 anos. E citava a Paraíba, trocando os algarismos: aqui, 47.
Agora os jornais citam estatística macabra: a média de vida do nordestino é de 57 anos apenas. Então, quando FHC limitou a aposentadoria aos 60 anos, decretou que nordestino se aposentaria 3 anos depois de morto.
Ainda hoje se ensinará nas escolas que somos todos iguais perante a lei: quem vive 74, quem 57 apenas. Ainda hoje, entre os famintos do NE, nascerá mais um. A alegria do lar é mentira no encarte da vida. Ficarão todos mais miseráveis. As bocas aumentarão, diminuirá o pão.
A gente diz que nasceu um inocente. Mentira! Nasceu um condenado à morte, como se culpado fosse.
Morte natural não é castigo a ninguém. Mas a outra, antecipada, por condenação, na guilhotina, na cadeira elétrica, é punição suprema. Quem nasceu na PB, tem, biologicamente, a longevidade dos gaúchos. Basta nascer nalguma família nobre para viver além dos 74. Aos miseráveis, como na guilhotina, a vida é ceifada prematura.
Quem escapou da pílula da Benfam não escapará da guilhotina social. Terá o pão, aleatório, como quem joga na loteria. Escola não terá. Família, facilmente, também não. Dissolve-se sob as crises econômicas. A sobrevivência passa pela prostituição, roubo, grupos de extermínio.
Você é paraibano? Passou dos 57 anos? Dê um abraço em você mesmo. Escapou da guilhotina social. Você é jovem ainda? Os cálculos de probabilidade lhe dizem que, - com certeza superior a 80% - você não chegará aos 60 anos. Não tem culpa mas já nasceu condenado à morte prematura. Se tiver poder econômico, ainda que aqui tenha tombado seu cordão umbilical, você não nasceu na Paraíba, nasceu na exceção.
Dizem as chaminés que a indústria cresce. Os parques das montadoras prometem milhares de carros por ano. Os cinemas exibem o filme do Oscar. A tv diverte com novelas. E se pensa que isso é para todos. Milhões jamais terão acesso ao progresso. Não passarão dos 30, 40, não verão os netos. São marcados para morrer na guilhotina da sociedade que jura direitos iguais a cidadãos iguais perante a lei.
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