Leia crônicas de F. Pereira da Nóbrega

F. Pereira Nóbrega


Desabrigados

Não só em Alagoa Grande, um pouco por toda parte, surgem desabrigados das águas abundantes. A gente vê a favela pendurada no morro, como fruta na árvore. Aquelas casas cairão. Esperam a chuva forte, a barreira em deslize. Vem a tv, fotografa o desesperado, de família soterrada. Decreta-se estado de emergência. O vereador vai falar bonito na Câmara. O deputado, mais bonito, na Assembléia.

Está claro que não há vontade séria de solução. Exceto agora, com o Projeto de mutirões habitacionais, do Governo Lula, planejamento para isso nunca houve. Desabrigados são analfabetos, não dão votos. Quem trabalha pró favelados não espere retorno. Esse é um mundo-cão em que o ser humano vale pelas vantagens que outros dele possam tirar.

Alunos de História têm dificuldade de entender como era possível a escravidão, pegando gente na África, trazendo em navios negreiros, vendendo aqui. A História de amanhã falará de nós, contemporâneos das favelas, vendo, omissos, casas pendurada hoje para caírem amanhã.

Já nos acostumamos a olhar favela de longe, achando tudo natural, dizendo não haver dinheiro para tanto. Certo é que o problema ultrapassa os recursos municipais. Mas é errado se dizer que não há solução. Falta vontade política, não falta solução.

Há na Paraíba milhares de desabrigados das chuvas. Choram uns porque perderam todos. Choram outros, mais felizes, porque perderam tudo. Como animais, ao Estado pedem só o pão e a furna da sobrevivência. Não invocam direitos, apenas “pedem”, num país em que todos são iguais perante a lei.

Eu também vou pedir. Aos desabrigados peço que se organizem em associações. Fala sozinho quem fala por si somente. E quem fala sozinho é mendigo, não tem direitos, não é cidadão. Porque a casa vai cair, porque os poderes dizem não ter dinheiro para desabrigados, urge surgirem dezenas de associações de favelados, desabrigados ou não.

Aos homens da coisa pública peço também. Ao menos nesta hora tratem gente como gente. Não lhes dêem puras ordens, Dialoguem. Mais do que de casa eles precisam ser tratados como seres humanos. Não se desagreguem comunidades, transferindo gente pra rumos distantes. A convivência do amigo, do parente, do compadre, talvez tenha sido o que restou da favela caída do morro. A amizade para eles vale mais do que dinheiro. E só por isso eles parecem mais gente do que nós.


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