F. Pereira da Nóbrega
















Jornal Correio da Paraíba, terça-feira, 03 de dezembro de 2002 Conduta e tempo





    Estudantes apedrejaram até a morte aquele mendigo. Jornais noticiam. Já nem comentamos. Tempo de comentários já passou, desde quando filhinhos de papai queimaram vivo o índio pataxó. Desculparam-se: pensaram que era um mendigo.


    Hoje não se desculpam. Nós não comentamos. Inseriu-se tudo no cotidiano. Porque há condutas temporais e outras, raras, fora de tempo.


    Virgulino não seria hoje o Lampião que foi. Nem Antônio, o Conselheiro de Canudos. Como quem olha o relógio para saber a hora, ou a bússola para saber o rumo, inconscientemente consultamos os valores sociais para nossas condutas. Cada tempo tem os seus.


    E existe consulta inconsciente? A cultural é assim. São-nos inconscientes a língua que falamos, as superstições que nos introjetaram. Há uma conjuntura de valores em cada sociedade pelos quais somos convidados a pautar nossas condutas. E somos linchados socialmente se discrepamos.


    Um menino de 11, outro de 9 anos - é outra notícia - foram alcançados roubando um Banco. A idéias lhes veio de fora mais que de dentro. Nos tempos do Conselheiro e de Lampião, - matar, nem tanto - roubar era a vergonha suprema. Entre nós medra uma aculturação ao crime. A mídia dá a sugestão. Os valores sociais começam a ser outros. E haja mendigo apedrejado. E haja infâncias começando pelo delito.


    Se tais condutas ocorrem em série, se vão se repetindo pelo país afora, se já nem nos assustam como no primeiro dia, tenhamos a coragem de ver claro, algo além da pura opção pessoal. Vejamos primeiro que os tempos mudam com rapidez incomum. Vejamos ainda que não há mais um denominador comum dos padrões de conduta e valores sociais.


    Constroi-se um novo mundo em cujo centro esteja o homem, não mais as divindades. Até aí tudo bem, se um sadio humanismo tem vez no pluralismo. A diferença poderia ser maior no pensar, menor no agir. Porque nas religiões, nos afasta de Deus exatamente o que nos afasta dos homens.


    Constrói-se um humanismo centrado no estrelato, poder, no sucesso e prazer. Hedonismo e egoísmo são as vertentes fundamentais do novo homem que se pretende construir. Por isso hoje começa a ser bonito apedrejar mendigo. Feio mesmo é não ter dinheiro. Menino de 9 anos, vá logo aprendendo a roubar.


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