Leia crônicas de F. Pereira da Nóbrega

F. Pereira Nóbrega


Amar, verbo irregular

No dia dos namorados, avisa-se a quem interessar possa que amar é verbo irregular.

Não me peçam seus tempos que todo tempo é marcha para o fim. E todo amor implora não ter final. Começa no tempo passado o presente de amar. Quando digo “te amo”, já amei, já é passado. Se digo “amanhã te amarei” já me denunciei, já comecei a amar.

Condicional é tempo que esse verbo não tem.

Você diz “vou se”, “atravessa se”. Mas o amor desconhece condicionais. Porque ama, você vai, vem, atravessa, salta impossíveis. Imagine que alguém amaria a jovem “se fosse rica’. É comércio, não é amor. Ama-se apesar de todos os pesares. Para o amor condições não há. Ao final, a gente nem sabe por que ama. O amor não tem “se” nem “porquê”. Amor não tem lógica e lógica não tem amor.

Para se amar, existir basta. Só isso é suficiente ao vento que leva o pólen às flores do mesmo galho, aos átomos que moléculas unem, às estrelas unidas em galáxias. Nasci para fazer na vida o que quisesse. Mas nasci condenado a amar.

Também deste verbo imperativo não há.

Se amar fosse imperado – de fora para dentro – em sua essência já estaria esvaziado. Amor é imperativo que vem de dentro. É escravidão gostosa e voluntária. Quando ele acontece ninguém se pertence mais.

À filha não diga o pai: ame este, não aquele. Ao longo dos anos de paternidade, de tanto mandar e desmandar, todos os imperativos o pai já conjugou. Agora se cale porque falta imperativo para o verbo amar.

O tempo perfeito é outro que não há.

Amor dos humanos é feito de ciúmes, briguinhas até gostosas demais. No final, a reconciliação é maior que o atrito. Os que se amam fazem entre si como Deis conosco faz¨: depois de cada falta, o mesmo amor. Deixemos às máquinas a rotina das perfeições acabadas. O perfeito é fim de linha. Monotonia inapelável, não tem mais para onde evoluir.

Ela se posta diante do espelho, nos mil requintes da feminilidade. Sente-se imperfeita. Buscando amor, busca aperfeiçoar-se. Fossilizou-se no passado a perfeição acabada.

Todos os tempos se confundem na irregularidade do verbo amar. Em compensação, outros restaram que noutros verbos não há. São tempos do amor escondido, proibido, inconfessável.


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