Leia crônicas de F. Pereira da Nóbrega


F. Pereira Nóbrega A construção da violência

Mataram a senhora enquanto passeava na praia de Intermares. Mataram com um tiro na boca. Nossa miopia receitará majorar penas, talvez de morte. O perigo é maior. Um funil de impunidade vai de crimes, cada vez mais abundantes até punições cada vez mais raras. No Rio, 90% dos homicídios não são esclarecidos. Dos 10% processados ainda resta o álibi do foragido. No Brasil há 245 mil foragidos, o mesmo número de detentos. Nem poderiam ser presos. Não têm onde.

Pior que o funil penal é nossa miopia. Se planto mandacaru, terei espinhos. Optamos por plantá-los sorrindo e podá-los chorando. Plantamos cada vez mais. Podamos cada vez menos.

Quer saber onde o plantio, onde a poda? Muito além de pessoas, plantamos um modelo social de violência. Não o mudamos. Podar nos contenta. O Ocidente diz que o sentido da vida é de pessoas elegantes, bem produzidas, boazudas, sensuais, para conseguirem estrelato e money. Para isso se vive e se morre. Diz-se que se vive para se ter grana para comprar o poder que compra o resto.

A sociedade excludente oferece cada vez mais, dá cada vez menos. Oferecendo, nos faz reféns do ter, consumista. Tirando, nos dá, cada vez mais, desemprego, impostos, qualificação cada vez mais refinada para a concorrência cada vez mais desleal. Já não é fácil se conseguir o primeiro emprego. A idade dos 40 já é fim de vaga no mercado do trabalho. Então trabalho e honestidade são insuficientes para o ideal de vida do Ocidente.

Só duas alternativas restam: a sorte e o crime.. A sorte se tenta nas loterias: domingo no turfe, segunda na Sena, terça na Estadual, quarta na Federal, quinta na Esportiva, sexta no jogo do bicho, sábado no milhão do SBT. Nenhuma resolve problema de massas. Então, acabou-se a última esperança, depois do trabalho honesto e do salário suficiente. Só resta o crime. Assalte, sequestre, caloteie. Ética morreu. Agora só é feio ser pobre.

A cultura da violência é exportada pela sociedade americana, onde, nas escolas, crianças matam crianças e professores. Seus enlatados ditam o mesmo em filmes e vídeo para o resto do mundo. De repente a criança brasileira começou a matar também.

Como é mesmo? A solução é aumentar penas? É plantar mandacaru, podá-lo depois? Não! A solução é outro modelo de sociedade, tangido por outros valores de vida. O Ocidente precisa ser repensado desde os fundamentos. [«]


Envie carta para Vini e Jobis

Assine nosso Livro Nosso Mundo - Página Inicial Cantinho Lilás - Página Inicial Assine a Lista de Atualização de "Nosso Mundo"
Clique abaixo para participar da lista Espiritavox