Da sede à fonte muita coisa acontece. A primeira delas é a necessidade. Nada mais revolucionário existe além dela. Para superá-la, o homem inventou artes e ciências, cidades, canais, barcos, aviões, satélites. Inventou a palavra e o gesto, idiomas e dialetos, trabalho e lazer, paz e guerra, o sim e o não - para a mesma causa: apaziguar necessidades.

Da sede à fonte, ele produz e aprende. Produz instrumentos: pote, caneco. Aprende onde a água, como obtê-la, portá-la, conservá-la. É a produção do saber, chamada ciência, e de instrumentos, chamada tecnologia. Ainda troca, vende a produção. Aparecem comércio e indústria.

Aí estão embrionárias, ciência, tecnologia, indústria, comercio, economia. Ai também, embrionárias, as formas do poder. Ciência é informação organizada. E informação é poder. Da produção ao comércio, eis o poder econômico. Inventou-se o dinheiro e eis o poder financeiro. Agora é poder de se comprar poderes. Só não é onipotência divina porque o homem não é Deus. Dinheiro é onipotência humana.

Enquanto iam da sede à fonte, se fizeram desiguais os que iguais nasceram. Enquanto poderes se atraem, se cumulam, é classe dominando classe, raça dominando raça, o homem dominando o homem.

Parece ilusório o caminho da fonte. A satisfação passa, a necessidade retorna. Acordarei amanhã carente da água e do pão, da veste e da caverna, do cavalo e do boi. Civilizações que os mortais construíram, quase 30, as destruíram todas, também por necessidade. A solução de ontem tomba, obsoleta hoje, obstáculo amanhã. Um dia, destruir é preciso. E a necessidade continua.

Precisei andar mais rápido, domestiquei aquele animal. Agora preciso de instrumentos para deter, banhar, alimentar, montar meu cavalo. Cada necessidade satisfeita gera mil outras novas. Eis-nos, na era espacial e atômica, muito mais crivados de carências do que no primeiro dia.

Passando da sede à fonte, nem o homem nem o mundo serão mais os mesmos. [«]

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