agatha christie
por Jade Boneff
Em todo o mundo, quando se fala em crime e mistério, o nome
de Agatha Christie aflora. A Rainha do Crime morreu há 23 anos, deixando
88 obras no gênero policial, além de peças de teatro e romances escritos
sob pseudônimo. Seus livros foram traduzidos para 103 línguas (14 a mais
do que Shakespeare) e venderam mais de 400 milhões de cópias. Alguns
resultaram em filmes espetaculares, como Assassinato no Expresso Oriente
( Murder on the Orient Express , EUA, 1974, de Sidney Lumet), que reuniu
um dos melhores elencos da história do cinema. Sua peça A Ratoeira
(1952), é recordista mundial em número de apresentações - foram 8.862
num único teatro.
Se ainda assim faltassem argumentos para ler Agatha Christie,
poderíamos citar seus dois famosos personagens, o detetive belga Hercule
Poirot e a vitoriana velhinha Miss Marple. De características e métodos
totalmente distintos, os dois resolveram dezenas de casos, algumas vezes
com a ajuda de personagens secundários recorrentes, como a escritora
Ariadne Oliver e o fiel amigo de Poirot, Capitão Hastings. Talvez por
medo que alguém se apropriasse de sua melhor criação, como recentemente
aconteceu com a seqüência de ... E o Vento Levou , a autora matou Poirot
no livro Cai o Pano (1975).
O universo de Agatha Christie é a Inglaterra dos anos 20. Sua
própria personalidade e história estão mescladas ali, na estrutura
social rígida da era pós-vitoriana, na valorização da nobreza e do "bom"
sobrenome, e até nos detalhes de decoração nos ambientes descritos.
Todo romance policial é uma batalha entre leitor e escritor. O
sucesso da trama reside na arte de disponibilizar todos os elementos
necessários para a solução do crime e, ainda assim, fazer com que o
leitor chegue à página final sem a menor idéia do que realmente
aconteceu (ou com a idéia errada, o que é ainda melhor!). Agatha
Christie tecia suas tramas com esta maestria, mas talvez pelo número de
livros que escreveu, ou talvez por um estilo tão característico, seus
crimes ficam mais fáceis de desvendar quando o leitor já leu uma
quantidade suficiente deles.
Há exceções. Assassinato no Expresso Oriente , por exemplo, seguia
a velha fórmula do "todos-são-suspeitos", mas levou a uma solução
totalmente inesperada. Um Crime Adormecido , romance publicado
postumamente, seguiu a fórmula de Os Cinco Porquinhos (a investigação
de um crime do passado) mas desviou-se para um final diferente. Ou seja,
ainda que se tenha a sensação de "ah, este aqui é parecido com aquele
outro", a originalidade da autora não permite que se descubra o
assassino pela mesma linha de raciocínio. Sem falar na originalidade de
O Assassinato de Roger Ackryod , com uma solução tão surpreendente que
mais vale não comentar para não estragar a surpresa.
Esqueça também o assassino-padrão. Apesar de notadamente
conservadora, Agatha Christie jogava a culpa nos ombros de qualquer um -
nobre ou serviçal, mulheres, homens, ingleses ou não. Suas vítimas
também variavam. Houve até o assassinato de uma criança em A
Extravagância do Morto . Motivos? Podem ser passionais, movidos pela
cobiça ou por "nobres" razões.
Esta variedade é o que faz com que suas obras sejam interessantes
até hoje. Pode-se até descobrir o assassino antes do meio do livro.
Ainda assim, vai valer a pena chegar até o final e acompanhar a
disposição das pistas, falsas e verdadeiras. Não basta saber assassino,
arma e motivo, como no famoso jogo Detetive . O grande desafio é
entender a autora, não a trama.
Este texto já foi publicado nos seguintes veículos: Esfera , Burburinho
pensamentos despenteados para dias de vendaval
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