Olhar que Adivinha


- Artur da Távola -


       De todas as adivinhações do amor nenhuma é mais
    funda que a dos olhares que se atam e parecem não poder
desprender. Namorados assim o fazem, paqueras, aranhas, serpentes, aves, répteis, mamíferos, amantes, amigos, esposos. O olhar aprisiona-se
    no mistério do outro. E fala de encontros não verbais,
 essenciais. Economiza tempo. Avança ou retrocede milênios na
                   adivinhação do próximo.


        O que será, este olhar? Susto? Sustar é paralisar. Há
     uma paralisia quando o amor é pressentido. Susto mas
                adivinhação.


        Adivinhação mas procura. No olhar de quem se adivinha
amando, paralelo à felicidade transmite-se procura, indagação,
   ânsia de descobrir que se veio ao mundo para resgatar as incompletudes daqueles com quem se relacionará profundamente, se
os encontrar e souber que encontrou .


            Procura mas encontro. No olhar que se cruza e paralisa cheio de significações encontra-se a instância deslumbrante na
      qual o ser se descobre aceito, querido e perdoado.



          Encontro mas impossibilidade. Tudo o que vai sendo proibido, velado, guardado, adiado, faz-se verdade no momento da
        hipnose do olhar que se atrai sem explicação.



        Impossibilidade mas permissão. As barreiras, medos, a
polidez, recatos, as resistências que surgirão (reação que não
se explica mas se tem) deixam de existir no instante do olhar
     que devasse a verdade funda. A entrega pré/sentida.



         Permissão mas mergulho na sombra. O demônio que mora
 dentro, a criança, o anjo, o pecado, o perdão, a esperança,
  todos os mecanismos secretos, guardados, não sabidos, raro
   assumidos, jazem fugidios e perceptíveis no olhar que se
                  defronta.
                                   
        Não me refiro ao olhar apaixonado. Falo de algo além,
o olhar que paralisa o outro. Que se apavora de adivinhar-se, possivelmente feliz, e se descobre em profundidade e espanto no
 poço do outro, no fundo do qual mora uma certeza nunca antes
 confirmada. Nada o detém, limita ou qualifica. Contém a pluralidade constitutiva da vida.
    Explode na hora do amor ou no instante da morte. Seus
   compromissos são com o fundo, o longe, o eterno, o imponderável,
  o denso, o lindo, a paz, a tragédia ou a glória. Sua relação é com
   as certezas que a razão nunca terá, mas a emoção, a intuição e o
sentimento (que vão além), de há muito as conhecem. Este olhar existe
quando e onde sempre existiu. E existirá, a despeito de nós.


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