ARTUR DA TÁVOLA |
O programa Observatório da Imprensa, marco na TV brasileira, está a
fazer três anos e o Alberto Dines, este gigante da liberdade, pediu-me
alguma palavra a respeito. Hoje existe acesa discussão acerca do
sentido do noticiário de televisões, rádios e jornais. Com muitos
anos de estrada, tenho uma tese, defendida, aliás, há alguns anos em
Congresso em Barcelona, para a completa indiferença do plenário... é
a de que o noticiário, no Brasil e no mundo, salvo exceções, está
dominado pelo hiper realismo.
O lema do hiper realismo pode ser sintetizado na frase que
alguém certa vez usou para defini-lo: "Mais verdadeiro que o
real." Ele acrescenta maior precisão e nitidez, mais força e
expressão ao que está sendo focalizado, enquadrado.
Ao mesmo tempo em que faz a realidade aparecer próxima do
espectador, aumentada por lentes, aproximações e destaques, o
hiper realismo aumenta a estranheza e insere um elemento
estimulador de reações, sem se afastar do real mas tornando-o
maior do que é, simulando, inclusive, ser ele a expressão da
realidade total e construindo uma linguagem na qual o recurso da
ênfase se transforma no próprio discurso. Distorce o real sem
dele se afastar. Daí a dificuldade de ser percebido em seu
sorrateiro processo de "aquecer" o real com fragmentos
amplificados da própria realidade.
O hiper realismo transforma em linguagem o que é recurso, como a
ênfase, por exemplo. Recria o real através dele mesmo, sem
reproduzi-lo mas se utilizando de seus elementos para a criação
de uma instância própria, de alta expressividade e participação
embora pareça relatar o acontecido de modo imparcial (sob a capa da
objetividade informativa). É estratagema de pungente força
transfiguradora pois utiliza, além do próprio real, a
verossimilhança e a meia verdade, unindo-as num todo coerente,
verdadeiro e ao mesmo tempo ilusório. É a mais penetrante e
sutil forma de denunciar porque só é subjetiva no momento da escolha da
objetividade destacada. Ou, no dizer de Karin Thomas: "A
temática fundamental do hiper realismo é a ilusão da realidade e
a realidade da ilusão." Para concluir, concordo que a imprensa
até julgue. Está no seu direito e dever. Já não concordo quando
após julgar, promove o linchamento.
Artur da Távola
Secretário da Cultura do Rio de Janeiro
.