MENOR TRABALHADOR


F. Pereira Nóbrega


Menor trabalhador

Provavelmente um menor lhe vendeu hoje este jornal. Amanhã, ao lhe comprar outro, olhe-o no rosto. Nas mãos, os calos, no rosto a fisionomia que você já terá visto, nem bem sabe onde. Os jornaleiros são os mesmos balaieiros de todas as (4 ou 5) feiras. São os lavadores de carro e vendedores ambulantes.

Quase metade da população brasileira é adolescente. E, destes, metade já trabalha, descendo até aos primeiros dias do uso da razão. Procedem de lares com cerca de dez pessoas. À noite, vários se amontoam na mesma rede, cama ou chão forrado.

Durante o dia, o pai não ganha sequer o salário mínimo. Por vez, o lar se desfez. E na vida do menor trabalhador entrou o padrasto, a madrasta. Piorou mais ainda.

A fome o obriga a ganhar na rua, a qualquer custo, para não ser espancado em casa. O desespero do pai, não raro, se refugia na embriaguez. E os problemas mais se avolumam. Acontece menor expulso da própria casa. Ou fugiu para não ser mais espancado.

Trabalha, sim, acordando com a madrugada para ser jornaleiro antes que a cidade acorde. Para vir da periferia ao centro, antes de o sol chegar. Para depois ser o feireiro, carregando um balaio maior que suas forças. Ele é sempre um suspeito, quase marginal, quase ladrão. Mas se revolta profundamente com tais suspeições.

Ao meio-dia, longe de casa, não tem dinheiro para o almoço. A qualquer hora, onde se recosta, adormece, semeando, entre as folgas do dia, pedaços da noite que lhe foi curta.

Sem contrato para um trabalho certo, sem férias, sem 13º! Para enfrentar a vida, nada mais tem, além de suas forças de quase criança, sempre magra, quase sempre doente. E ainda lhe falta INPS. Mesmo assim, alguns, aos 15 anos, são arrimo de uma família inteira.

Não viveram a infância e já vão entrando na adolescência. Da criança que não foram guardaram a vontade de viver só o presente: o trabalho de hoje para o pão de hoje. O futuro não conta, aspirações não têm. A juventude os surpreende, despreparados para a vida.

Esta noite eles voltarão para casa - os que ainda têm casa. As mãos calejadas mais uma vez adormecerão vazias. E, sob o rosto da criança que nunca foram, sonharão apenas com um trabalho que pague mais e pese menos.


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