SEIS PONTOS DE UMA REVOLUÇÃO SISTÊMICA Por Joana Belarmino. INTRODUÇÃO A manhã de sábado é tranquila e plena de sol, como o são quase todas as manhãs de sábado dos verões de João Pessoa. Depois de haver tomado o café, sento-me à minha mesa de trabalho diante do computador e antes de iniciar o que chamei de "introdução" deste ensaio, dou uma olhada no correio eletrônico, navego um pouco pelos principais jornais do país, "visito" páginas científicas do meu interesse, consulto meu saldo bancário. Vou até à página da Puc, de onde recolho as últimas atualizações sobre o congresso de semiótica. Finalmente retomo a introdução do meu tema de trabalho, a revisar esse primeiro parágrafo. Descrevera nele, a rotina comum de uma estudante de posgraduação, e as interfaces usuais do início do século XXi, em que o computador tornou-se uma ferramenta rotineira. O que me surpreende porém, e me emociona,é o fato de eu ser uma pessoa cega, que ao lado de todas as pessoas cegas das chamadas "culturas letradas", tem sua história "evolutiva", do ponto de vista da sua inlusão nessa cultura "letrada" comprimida em um lapso tão curto de tempo. Pois é certo que a história da "alfabetização" desses indivíduos, ou por outra, a estratégia que provocaria um "salto de qualidade" no processo de refinamento e especialização do sentido do tato como um canal privilegiado para a percepção das pessoas cegas não completou ainda duzentos anos. Mas esse lapso de tempo só ganha importância se for apreciado não do ponto de vista da datação fria dos calendários e da história tradicional, mas antes, se estiver aliado à própria história da evolução da espécie humana no planeta. Conforme frisa Capra (1996: 206/207), " Para demonstrar quão tardiamente a espécie humana chegou ao planeta, o ambientalista californiano David Brower concebeu uma narrativa engenhosa, comprimindo a idade da Terra nos seis dias da história bíblica da criação. No cenário de Brower, a Terra é criada no domingo à zero hora. A vida, na forma das primeiras células bacterianas, aparece na terça-feira de manhã, por volta das 8 horas. Durante os dois dias e meio seguintes, o microcosmo evolui, e por volta da quinta-feira à meia-noite, está plenamente estabelecido, regulando todo o sistema planetário. Na sex- ta-feira, por volta das dezesseis horas, os microorganismos inventam a reprodução sexual, e no sábado, o último dia da criação, todas as formas de vida visíveis se desenvolvem. Por volta de 1:30 da madrugada do sábado, os primeiros animais marinhos são for- mados, e, por volta das 9:30 da manhã, as primeiras plantas chegam às praias, seguidas, duas horas mais tarde, por anfíbios e por insetos. Dez minutos antes das dezessete horas, surgem os grandes répteis, perambulam pela Terra em luxuriantes florestas tropicais du- rante cinco horas, e então, subitamente, morrem por volta das 21:45. Enquanto isso, os mamíferos chegam à Terra no final da tarde, por volta das 17:30, e os pássaros já à noitinha, cerca das 19:15 horas. Pouco antes das 22 horas, alguns mamíferos tropicais que habitavam árvores evoluem nos primeiros primatas; uma hora depois, alguns destes evoluem em macacos; e por volta das 23:40 aparecem os grandes símios antropóides. Oito minutos antes da meia-noite, os primeiros símios antropóides do sul se erguem e caminham sobre duas pernas. Cinco minutos mais tarde, desaparecem novamente. A primeira espécie humana, o Homo habilis, surge quatro minutos antes da meia-noite, evolui no Homo erectus meio minuto mais tarde e, nas formas arcaicas do Homo sapiens, trinta segundos antes da meia-noite. Os Neandertais comandam a Europa e a Ásia de quinze a quatro segundos antes da meia-noite. Finalmente, a espécie humana moderna aparece na África e na Ásia onze segundos antes da meia-noite, e na Europa, cinco segundos antes da meia-noite. A história humana escrita começa por volta de dois terços de segundo antes da meia-noite...". Se fôssemos pois, subdividir essa escala de tempo para datarmos, de acordo com o calendário de Brouwer, uma unidade de tempo precisa para delimitarmos o ponto dessa história em que foi possível à uma pessoa cega o seu meio natural de escrita, decerto não encontraríamos tal unidade, visto ser tão infimamente curto esse lapso de tempo, do ponto de vista da evolução como um todo, e tão exageradamente tardio quando confrontado com a história da evolução dos seres humanos a partir dos seus inventos.1 Essa história e os seus desdobramentos, nesses cerca de duzentos anos, é o tema central deste ensaio. A tilologia,2 os estudos biográficos e mesmo a literatura especializada no âmbito da educação e da historiografia já puseram à disposição dos interessados, documentos descritivos sobre o acontecimento da leitura e da escrita para as pessoas cegas. Meu esforço se fará porém, num sentido diverso. Será como uma espécie de estratégia de um eletricista, que se vê diante de uma rede em que alguns circuitos ou fios foram negligenciados e cuja ligação/interconexão será de fundamental importância para o entendimento do funcionamento global da rede. Será as vezes, como a experimentação que faria um biólogo iniciante, a mapear as ínfimas porções de uma célula, para posteriormente aliar sua compreensão global no centro e dentro de uma têia de relações significativas. Uma têia de relações que se for devidamente apreciada, configurará nessa curta história evolutiva das coletividades cegas, uma espécie de "ponto de bifurcação",3 um salto de qualidade que ampliou/amplificou o que provisoriamente chamarei de "mundividência tátil", propiciando-lhes não apenas a qualificação tátil, mas alargando o seu espaço de atuação, permitindo-os migrar para "lugares" sócioculturais até então vedados a esses grupos. Releio o já escrito e me apercebo de que não nomeei ainda o código que possibilitou aos cegos de todo o mundo, as chaves para o seu ingresso na "cultura letrada". Usualmente, a literatura especializada, a tiflologia e a educação especial4 classificam esse código de leitura e escrita dos cegos como "sistema braille", num homenagem ao seu invetor, o francês Luís Braille (1809/1852). Nenhum desses campos de conhecimento porém, ocupou-se em compreender o código braille como um verdadeiro sistema, na acepção científica do termo. Um sistema lógico/matemático, um sistema semiótico de modelização, um sistema cognitivo, um sistema bio/eco/antropolótgico, pois a exemplo de todas as interfaces criadas pelos sistemas vivos, acha-se sintonizado com o plano cósmico de permanência da vida na terra, no universo. Para compreender o código braille como um sistema, foi pois necessário que eu modificasse o meu próprio foco de observação dessa história, estabelecendo as veias de indagação/comunicação entre o sistema de braille e esse conjunto cada vez mais amplo das disciplinas que se ocupam das ciências da vida e dos seus sistemas. A Teoria Geral dos sistemas será pois o guia central para este empreendimento, conjuntamente com algumas das disciplinas com as quais dialoga, a exemplo da cibernética, teoria matemática da informação e semiótica. "Tatear" essa história, para refazer as ligações entre os fios e conexões propostos para o eletricista ou o biólogo iniciante, é por certo tarefa que excede aos limites deste ensaio. Aqui, só poderei esboçar as questões fundamentais que me interessam, algumas das quais serão fruto de um trabalho mais aprofundado de pesquisa. Elas todas acham-se envolvidas por uma questão fundamental, que discute os aspectos cognitivos da percepção tátil. Leitores deste trabalho poderão dizer que estarei resvalando para o campo metafórico, ao falar de uma qualidade de "visão" que habita a experiência da cegueira. Mesmo correndo o risco, é para essa discussão que encaminharei o primeiro item do trabalho. A seguir farei uma breve revisão do conceito de sistema, estabelecendo o "lugar" do código braille nessa têia de relações que o configuram como tal. Será indispensável um resgate dos seus antecedentes, na linguagem da cibernética social, sua "epigênese"5, o que propiciará uma compreensão dos caminhos que contribuíram para a formulação de Braille. Um terceiro item dará conta de questões mais gerais, as quais sedimentarão aquelas visões do código braille como um sistema bio/eco/semiótico. Apresentarei o código braille não apenas como um sistema que "modelizou" a escrita convencional em sua matriz de pontos, mas um alfabeto com toda uma gramática a desvendar, inaugurando um processo de cognição ancorado na percepção tátil, inaugurando pois, um modo particular de esquadrinhamento do espaço, de relacionamento com o mundo, se quisermos, qualificando o já referido "modo de ver" que habita a cegueira. Notas 1. A escrita manuscrita surgiu num período entre 5 a 3 mil anos antes de Cristo. O código Braille somente se apresenta à sociedade francesa, numa primeira formulação, em 1829. 2. A expressão foi cunhada na França, para caracterizar os estudos relativos à temática da cegueira. 3. Prigogine utiliza a expressão para caracterizar estados em que um dado sistema está se afastando muito do seu equilíbrio, até que seja alcançado um limiar de estabilidade. Esse limiar é denominado "ponto de bifurcação". Trata-se de um ponto de instabilidade, do qual novas formas de ordem podem emergir espontaneamente, resultando em desenvolvimento e em evolução. Conforme Capra, "...Matematicamente, um ponto de bifurcação representa uma dramática mudança da trajetória do sistema no espaço de fase. Um novo atrator pode aparecer subitamente, de modo que o comportamento do sistema como um todo "se bifurca", ou se ramifica... ". Considerando o ambiente em que se desenvolviam as estratégias para a leitura e escrita dos cegos, considerei o surgimento do braille como um ponto de bifurcação, na medida em que as estratégias primordiais se modificam profundamente e se ramificam em novas formas de representação da cultura letrada. 4. O governo brasileiro instituiu a expressão "educação especial" para designar métodos, técnicas e estratégias voltadas ao ensino/aprendizagem dos estudantes portadores de deficiência. 5. Waldemar de Gregori utiliza o conceito para caracterizar a interligação dos diversos ciclos sistêmicos, afirmando que "Cada novo ciclo de um sistema, ou o ciclo de cada sis- tema, nasce ou se apóia na extremidade do anterior, coexís- tindo superpostamente em algum espaço e por algum tem- po. O nome para essa coextensão é epigênese (trata-se de uma redefinição desta palavra). Os filhos são uma epigê- nese de seus pais. A revolução é uma epigênese do status quo. O faco é que tudo se apóía em tudo, é um castelo de cartas, é escamado". (De Gregori, 1998: 58). 1. A MUNDIVIDÊNCIA TÁTIL: DESATANDO OS NÓS DE UMA EXPERIÊNCIA Curvada sobre sua carteira escolar, uma menina de sete anos preme no papel, os pontos de uma pergunta, ainda indistinta, quase inconsciente; esboça sem o saber, as primeiras letras de um paradoxo, ao mesmo tempo científico, psicológico, social e existencial. O que vê a cegueira? O ano é 1964, a menina é cega e aprendeu com as pedras, a dura lição de tentar enxergar uma primeira resposta para essa questão, sob a capa dessa experiência. As pedras são como lugares em que a natureza trabalha em silêncio. Lugares em que as moléculas, os átomos, em sua cavalgadura, são testemunhas do tropel cosmico que produzem, criando os ciclos da vida. A menina tinha fascinação pelas pedras, assim como pelo vento, pela chuva anunciada no campo através do modo plural que a natureza tem de nos falar. As pedras, sobretudo, enchiam sua infância de espanto e perplexidade. No patio da casa, um patio de terra batida que sua mãe cuidava de varrer todas as manhãs, havia uma fileira de quatro ou cinco pedras, encostadas a parede da cozinha. Fila indiana de rochas irmãs, algumas mais altas, outras mais baixas, todas pouco menores do que ela, no topo dos seus quatro anos. Naquela epoca, em algum sítio da sua consciência, ja havia se incrustado a sua senssação de cegueira, algo obscuro, e certo, mas pleno dessa situação ambigua onde por certo já conviviam pequenas angustias, pequenas alegrias. Numa manhã de sol radiante, marchava ela defronte das pedras, num passeio ritimado de criança, quando deu pela presença das pedras. Nao que não soubesse que elas sempre ali estiveram, por as ter tocado, por ter feito delas extensoes das suas brincadeiras infantis. Dera pela presença das pedras de um modo novo, como se as estivesse vendo. As pedras lhe comunicavam sua presença irradiando na face. Como ela não sabia o que era "ver", tomou por "visão" aquele acontecimento. E maravilhada, marchou diante das pedras, como se estivesse em transe, repetindo um mantra que inventara naquela horinha mesmo: "Eu vejo! eu vejo!" Dizia aquilo com a inocencia e a convicção de uma criança de quatro anos. Foi quando para "ver melhor" uma pedra, calculou mal a distancia entre sua face e a rocha e esbarrou brutalmente contra a mesma, interrompendo a sangue e a dor, a doce lição de "ver" dentro da cegueira. Lágrimas e remédios caseiros empurraram para o fundo da memória a força daquela experiência, e, por muitos e muitos anos,ela não pensou mais naquele primeiro ritual de iniciação, duro ritual que lhe tinha posto sozinha com sua cegueira, exposta as bordoadas nas pedras. Não pôde compreender de imediato, a verdade que as pedras haviam lhe ensinado. Essa verdade não se revelou por inteiro, mas aos poucos, por insinuações, pensamentos, conjecturas. As pedras, a seu jeito, golpeando-lhe a face com sua rude estrutura, haviam lhe ensinado a "ver" mesmo dentro da sua cegueira. Levou tanto tempo para decifrar os nos daquela experiencia! Caminhava, caminhava, e sempre, de algum modo, retomava aquela afirmação infantil, agora sob a forma de pergunta: O mantra se renovara: Ja não afirmava mais "eu vejo!", mas antes indagava: O que vê a cegueira? Longe de a desanimar, a pergunta a incitava a dizer coisas, a montoar palavras, a enfileirar frases e mais frases, ao modo da fileira de rochas, na sua tentativa de tornar clara essa "visão" que tambem habita a cegueira, reproduzindo o claro-escuro que sempre parece estar presente no ato do homem de observar o real. O que vê a cegueira? Era para essa descoberta que ela caminhara naqueles dias de 1964, agora não mais instigada pelas pedras, mas munida por artefatos técnicos: Papel, reglete, punção,1 desenhavam agora o relevo da sua pergunta, renovando-lhe o sentido, criando para ela um nicho tecido de palavras e mais palavras. A menina cresceu e de novo pôde apreciar a velha lição das pedras, agora burilada, como joia nova e brilhante. "A minha cegueira é uma forma de visão"! "A minha cegueira é uma forma de visão"! Dentro da sua cegueira, compreendeu que sempre vira com o corpo inteiro. Via com os pés, que lhe indicavam as mudanças de solo; via com as mãos, com a face; via por todos os poros do seu corpo e continuava vendo, todo um espetaculo interior que habitava o seu intimo, a sua mente, e dialogava com o mundo exterior de um modo próprio, o seu modo de "ver". Percebeu como a experiência da cegueira acha-se ela própria "imunda" de visão, e as tantas vezes em que tivera vergonha disso, as tantas vezes em que negaceara essa visão olfativa, auditiva, todos os "orgaos de ver", espalhados por seucorpo a fora, e que lhe tinham sido revelados pela lição das pedras"! (Belarmino, 2000: 18). E novamente recoloco aqui a questão, exposta do modo indisciplinado e descomprometido da linguagem que me permitira a crônica: "O que vê a cegueira"? Retomo a questão, certa de que não a alcançarei na sua totalidade, com toda sua carga ontológica/filosófica/epstemológica/biosócio/psicológica/cultural. Para enfrentar o problema, melhor será pois que eu o reformule: Poderia perguntar então, o que é a "mundividência tátil",2 de que modo ela se estrutura. E eis-me novamente a resvalar para um terreno estremamente escorregadio, ou seja, o terreno da cognição humana, na medida em que estou a preocupar-me com o problema da percepção do mundo por parte de indivíduos cegos, privados portanto de um canal fundamental: O canal visual. Ao longo da história das culturas humanas, cegueira/ visão sempre produziu um manancial de idéias: Houve quem falasse desse acontecimento de "cegos videntes". A mitologia, o cinema, a literatura, a poesia, "animaram" uma espécie de metáfora da cegueira como "visão", A metáfora porém, em geral alçou o indivíduo cego para além da sua terra; elevou-o para perto dos deuses, fez dele um ser que continuava "estranho" no mundo dos viventes.3 Não é pois essa qualidade de "visão mágica" que habita a mundividência presente na experiência da cegueira. Provisoriamente, direi que esta "mundividência" se estrutura a partir de um conjunto de senssações do mundo, que "acontecem" em todo o corpo e que se especializam nas terminações nervosas localizadas nas pontas dos dedos. Ou seja, é aquela idéia básica de que a experiência da cegueira é sobretudo um aprendizado estratégico de transformar os diversos órgãos do corpo em "órgãos de ver". A passagem seguinte ilustra bem esse pensamento: "... O cego de Puisaux avalia a proximidade do fogo pelos graus de calor: a plenitude dos vasos, pelo rumor que fazem ao cair os l¡quidos que transvasa; e a vizinhan‡a dos corpos, pela a‡„o do ar sobre o seu rosto. t„o sens¡vel …s menores vicissitudes que sucedem na atmosfera que pode distinguir uma rua de uma betesga. Aprecia com perfei‡„o os pesos dos corpos e a capacidade dos vasos; e converteu os bra‡os em balan‡as t„o justas, e os dedos em compassos, t„o experimentados, que, nas ocasi”es em que essa esp‚cie de est tica se realiza, eu apostaria por nosso cego contra vinte pessoas que enxergam. (Diderot, 1987: 7). Para além da ação individual, a "mundividência" presente na cegueira exibe uma "transação" permanente do indivíduo cego com o meio ambiente exterior, a qual se acha em permanente mutação/atualização, em função das próprias mudanças ambientais naturais/artificiais. Se os filósofos tivessem reservado uma parcela do tempo dedicado aos estudos de óptica para investigar o fenômeno da percepção tátil, por certo desvendariam nessa realidade, uma "têia sistêmica" tão complexa e tão rica como aquela encontrada pela biologia com respeito ao processo de "ecolocalização" dos morcegos. É o próprio Richard Dawkins que faz associação entre esa descoerta e uma espécie de "visão facial" praticada pelos indivíduos cegos quando afirma: "... Em que mais poderia pensar o t‚cnico? Ora bem, os homens cegos, por vezes, parecem ter um sentido misterioso dos obst culos que se encontram no seu caminho. A isto foi dada a designação de "visão facial", porque os cegos referem que d  um pouco a sensa‡ão de um toque na face. Conta-se a hist¢ria de um rapaz completa- mente cego que conseguia andar de triciclo, em boa velocidade, … volta do quarteirão pr¢ximo de sua casa, utilizando a "visão facial". (Dawkins, 1986: 39). No entanto, nenhum "mistério" há nesse processo de "visão facial". Ele não exibe senão, o aspecto cinestésico dessa complexa têia interativa entre indivíduo cego e os objetos do ambiente à sua volta. Toda essa transação/negociação entre o aparelho neurosensóriomotor do indivíduo cego e o mundo ganha em refinamento e complexidade na percepção tátil, que não pode ser pensada como um "substituto" da percepção visual, mas antes, como um modo particular de percepção do mundo, um modo particular de cognição. Concordando com a afirmação de que "a cognição não é a representação de um mundo que existe de maneira independente, mas, em vez disso, é uma contínua atividade de criar um mundo por meio do processo de viver (In capra, 1996: 211), tenho pensado na invenção do alfabeto braille como um genuíno ato de cognição, um processo que significou um salto de qualidade para os indivíduos cegos, ampliando e qualificando o que Ucxkuhl classifica como "unwelt" da espécie humana, para caracterizar um profundo paralelismo entre as configurações que surgem no mundo, os processos de interação dos seres vivos com o mundo e a linguagem natural que nós usamos no dia a dia. A matriz básica dos seis pontos braille, esse pequeno filete retangular apto a ser percebido pela polpa do dedo, gerando um alfabeto ordinário de 64 combinações, foi, conforme já frisei, um "ponto de bifurcação" na história da alfabetização das pessoas cegas. Entendo que para que se possa vislumbrar o tamanho dessa conquista, será necessário alargar os focos de observação do sistema braille para além das suas fronteiras. Será necessário ampliar o rol das questões que até então foram formuladas sobre o sistema braille e sua repercussão na vida das pessoas cegas, pela tiflologia, pela educação especial, pela psicologia, pela sociologia tradicional. É necessário pois, situar o invento de Braille no contexto da história do desenvolvimento da espécie humana, no âmago da história da sua evolução bio/antropo/psico/sociológica e cultural. Se recuarmos no tempo, se por um processo de abstração recompusermos o cenário em que os primatas migravam para a savana e equilibravam-se nos galhos das árvores, apanhando com suas mãos os frutos das suas colheitas; se pensarmos nos gestos quotidianos dos nossos ancestrais, a burilar pedaços de pedra bruta para forjar as armas com as quais intervinham na natureza, estaremos por certo diante de processos indispensáveis para que se desenvolvessem no cérebro as possibilidades de um futuro em que surgiria a escrita e toda uma renovação profunda na cultura humana que a escrita produziu. Os gestos da savana, aparentemente casuais e instintivos, por certo comunicavam-se com as leis cósmicas que permitiram que se forjasse o "homus/erectus", portador de possibilidades no cérebro para a formação do "homem da cultura letrada". Com esse arranjo singular, concebido entre homem e natureza, o que pretendia a espécie humana se não garantir a sua permanência no universo? porque é certo que quanto mais o homem for capaz de ampliar suas potencialidades biopsíquicas e sócioculturais, mais ele estará fincado no projeto de permanência do universo, da sociedade, da cultura. A escrita não era se não, mais uma das inúmeras soluções de permanência do homem nesse mundo. Agora convido o leitor a pensar comigo nessas questões do ponto de vista do contexto da coletividade cega. Pensemos nos milhares e milhares de anos em que se produziu um profundo hiato, um fosso aparentemente intransponível entre a cultura da escrita e os indivíduos cegos. Porque ainda não são passados duzentos anos do advento do braille; Ainda não são passados duzentos anos daquele momento primordial em que pela primeira vez uma pessoa cega pôde tocar num arranjo duro de pontos e decifrar ali uma palavra. O que teria significado esse prolongado hiato na vida das pessoas cegas? De que modo ele repercutiu nos cérebros desses indivíduos? Em que lugar da cultura ele os situou? Ainda que com algumas lacunas, mas com ilustrativos relatos, a história de certo modo já nos disse onde estavam esses indivíduos durante o tempo desse hiato. Potencialmente, eles tinham o mesmo cérebro forjado na faina das savanas; podiam pensar, inquirir o mundo com seu aparelho sensório-motor onde no entanto, falhava a função de um órgão fundamental: O órgão da visão. Esse fato inelutável, a limitação da cegueira, os situava pois nas periferias, nas bordas da cultura, da sociedade, ali onde não são reconhecidos direitos e deveres, ali onde não se faz conta de opiniões, sentimentos, desejos e vontades. Ali onde as pessoas são meio que incompletas, deformadas, ali onde indivíduos não são vistos, se não como peças inválidas de uma engrenagem que é necessário arquivar. Pensemos agora na célula braille. Imaginemos uma folha de papel em branco, em cujo centro haja uma representação dos seis pontos de braille. O que foi que Louis Braille fez com esse delgado filete de seis pontos justapostos? Agora pensemos em quanto tempo uma pessoa cega leva para perfurar esses seis pontos: Um segundo? Dois? Aludo a essa metáfora para pensar numa coisa fascinante. Em um, talvez dois segundos, nesse gesto de premir seis pontos em um papel em branco, Braille os conectou com a cultura escrita. Com um clique de nada, Braille criou as chaves para a inclusão desses indivíduos em vários outros mundos: Os profissionais, os educacionais, os tecnológicos, outros mundos estéticos, afetivos e prazerosos até então desconhecidos para eles. Foram somente seis pontos que deram começo a uma revolução: A revolução de reabilitar indivíduos, de melhorar seu lugar e sua posição dentro da cultura. Para além do indiscritível prazer de poder ler e escrever; para além do mágico movimento entre mão e cérebro, decifrando a cultura da escrita, o que teriam disparado nos cérebros desses indivíduos, os seis pontos de braille? Que tipos de sinapses e conexões neuroquímicas o gesto de braille teria despertado em seus newcórtex, conexões estas que poderiam estar adormecidas desde o tempo das savanas? Somente a menos de duzentos anos foi dada à essa coletividade, a ferramenta para a leitura e a escrita; o que será que essa ferramenta estará produzindo em seus cérebros? Se a ciência, se a tiflologia quiserem ocupar-se dessa questão, por certo inaugurarão um capítulo novo e surpreendente na história da cegueira; por certo perceberão aspectos do sistema braille nunca antes devidamente considerados ou imaginados. Por certo perceberão nesse arranjo matemático simples que é a matriz básica dos seis pontos braille, a concretização de uma complexa gramática, combinando o relevo e o espaço vazio, para representar música, matemática, desenho, cartografia, entre tantas outras linguagens do mundo que puderam então ser decifradas por essa coletividade. É, a meu ver, a descoberta de braille que amplia e amplifica a idéia da cegueira como uma forma de visão, não mais uma espécie de visão mágica, "adivinhatória" e por si só excludente, mas uma visão particular do mundo, que a partir da leitura e da escrita, se refina e se qualifica, alcançando no limiar do terceiro milênio, importantes conquistas também no âmbito das interfaces tecnológicas. Notas 1. Instrumentos básicos para a escrita braille. 2. Podemos entender "mundividência" como visão de mundo, dependente do contexto biológico e sócio-cultural do indivíduo. é um conceito da filosofia, mas com utilização na descrição de alguns sistemas, a exemplo do cérebro humano. 3. No primeiro capítulo do meu livro, "Associativismo e Política: A luta dos Grupos Estigmatizados pela Cidadania Plena", aprresento um breve panorama dessas visões que povoam a literatura, o cinema, o discurso religioso, entre outros, com respeito à essas representações mágicas sobre a cegueira. 2. A EPIGÊNESE DO SISTEMA BRAILLE Em seu livro "Comunicação Mundo, História das Idéias e das Estratégias", o pesquisador Armand Mattelar discute o estreito entrelaçamento existente entre os interesses bélicos e os grandes inventos de comunicação e de informação dos últimos dois séculos. Afirma ele: "...Esta história da comunicação internacional e de suas representa- ções é a história dos entrelaçamentos que se foram tecendo entre guerra, progresso e cultura, assim como a trajetória de seus reajusta- mentos sucessivos, seus fluxos e refluxos. Ora, a guerra e sua lógica são componentes essenciais da história da comunicação internacional, de suas doutrinas e teorias, assim como da forma como foi utilizada em diferentes circunstâncias. Tal fato verificou-se desde o aparecimento do telégrafo e da fotografia" (Mattelar, 1991:9/10). Curiosamente, são interesses militares que vão suscitar o "experimento matriz" que será de profunda influência para o invento de Braille, ou seja, a escrita fonética de Charles Barbier, da qual falarei mais adiante. Não me deterei aqui, a contar a história detalhada dos diversos experimentos para as possibilidades de leitura e escrita das pessoas cegas. 1 É certo que ao longo da história das culturas civilizadas esse problema só ganhará maior relevância a partir do século XVIII, mas nenhuma iniciativa importante será pensada até o surgimento da primeira escola para cegos, criada em Paris, em 1784, quando o filantropo Valentin Jaüy dedicar-se-á à instrução desses indivíduos, através do seu método de relevo linear. Gosto de pensar que os métodos para a leitura e escrita das pessoas cegas fundaram-se em três eixos básicos, apontando cada um deles para um tipo de "modelização semiótica2: O método do relevo linear, criado por valentin Haüy, que exibia uma modelização em relevo da escrita convencional; a escrita fonética de Charles Barbier, uma modelização das transmissões telegráficas que ganhavam fôlego na época, mas também uma espécie de modelização do código sonoro presente na linguagem verbal; finalmente, o braille, um alfabeto autônomo, modelização da escrita tradicional em uma base completamente nova, na medida em que substitui o traço, "palavra" básica da escrita manuscrita, pelo ponto, inteiramente tangível ao canal de percepção tátil. Se verá ainda, como ao longo de dezenas de anos, as primeiras estratégias privilegiaram uma espécie de "leitura analítica", de cujo rompimento o sistema braille também encarregar-se-ia de realizar, instituindo de vez a "leitura sintética", refinando assim as qualidades perceptivas do canal tátil. Era lenta e penosa a leitura através do método do relevo linear. O arredondado das letras, suas curvas, constituíam-se em uma espécie de "contra/informação" ou "informação paralela" ao tato, se quisermos, apresentava um excesso de "ruído", na decodificação da informação. A escrita se dava somente por meio da composição tipográfica, o que impedia que na escola de Jaüy, se praticassem exercícios como cópias e treinos ortográficos em classe, conforme relata Henri: "...Además, aquel método tenía el grave inconveniente de no prestarse a la escritura, de suerte que los deberes, los dictados ortográficos, las redacciones, ete., quedaban reducidos a ejercicios de composición tipográfica, forzosamente lenta, por mucha que fuese la destreza del sujeto, y además de esto, irremisiblemente condenados a desaparecer en seguida." (Henri, 1988: 32). No entanto, é somente por esse método que os cegos terão acesso à alguma leitura, até o ano de 1823, quando conviverão por algum tepo naquela escola, o relevo linear e a sonografia Barbier. Pode-se dizer que o método de Charles Barbier é um marco na história da alfabetização dos cegos, na medida em que rompe de vez com o traço e a curva, instituindo o ponto como estratégia básica para a leitura e a escrita. As pesquisas do capitão Barbier, no sentido de criar um código para a transmissão de mensagens secretas entre bases aliadas começam em 1809, mas não conseguem angariar o interesse dos seus superiores. Em 1823, Barbier faz seus primeiros experimentos públicos do seu método, com alunos da escola de Haüy, tendo como testemunhas, dois membros da intelectualidade científica francesa, conforme relata Henri: "...La escritura ordinaria, dicen, es el arte de hablar a los ojos; la que ha ideado el seNor Barbier es el arte de hablar al tacto" (Henri, 1988: 50). Conforme Lemos, (vide bibliografia), "O invento de Barbier tinha por base, doze pontos, seis linhas e trinta e seis s¡mbolos representativos dos principais fonemas da l¡ngua francesa. O sistema tinha a vantagem de permitir a leitura pela identifica‡ão mais f cil das letras, com sinais em pontos, e ainda, a vantagem de permitir a escrita em um aparelho especial, inventado pelo pr¢prio Barbier, mas, tinha tamb‚m, a desvantagem de ser, apenas fon‚tico (representa‡ão de s¡labas), dificultando a aprendizagem da grafia das palavras". Experimentado nas duas formas de alfabetização, Poucos anos depois, Luís Braille estava pronto a apresentar ao mundo seu próprio método de leitura e escrita, em que a simplicidade aparente de uma célula básica de seis pontos justapostos exibia a complexidade de um genial arranjo lógico matemático, um alfabeto completo, permitindo aos cegos do mundo inteiro, independência, autonomia, liberdade. A primeira versão do seu sistema, divulgada em 1829, sofria ainda influência do método criado por Charles Barbier, conforme a descrição recolhida em Pierre Henri: "... En 1827 se transcribieron en el nuevo procedimiento del joven Braille unos fragmentos de La grammaire des grammaires, y en 1829, La Grammaire de Noël y Chapsal. Ese mismo ano se publicó la primera explicación del nuevo método de escritura, bajo el título: "Procédé pour écrire les paroles, la musique et la plain -chant au moyen de points, à I'usage des aveugles et disposés pour eux " Par L. Braille, répétiteur à l'Institution Royale des Jeune.s Aveugles. París, 1829 (lámina II A). Ese tomito de 32 páginas, que Pignier dice3 haber escrito al dictado del propio Braille, se imprimió naturalmente en relieve lineal, puesto que ésa era la clase de caracteres que entonces se ensenaban a los ciegos, y viene a ser la verdaderac acta de nacimiento del sistema Braille. Contiene, páginas 14 a 16, el cuadro del alfabeto Braille original que comprendía nueve series de diez signos, más seis signos suplementarios. No es igual a nuestro alfabeto de hoy más que en las cuatro primeras series que, con sus 40 signos metódicamente derivados unos de otros, vienen a constituir lo esencial. En las series siguientes se combinan puntos y rayitas horizontales lisas: la quinta, reservada a las cifras, se basa, según el propio autor confiesa, en "un principio ajeno al resto del procedi miento"; la sexta se forma de los signos de la primera, con una rayita lisa debajo; la séptima, por una anomalía poco explicable, se forma de los mismos signos pero esta vez con la rayita lisa encima; en la octava, la línea lisa está puesta en medio y, en cuanto a la novena, reproduce los signos de la quinta subrayados por una rayita." (Henri, 1988: 53/54). É ainda Henri que nos informa sobre a nova edefinitiva versão do método, publicada em 1837: "...El texto de 1837 es mucho más claro que el de 1829. Se ve que Braille, durante esos ocho anos, ha madurado su proyecto. Renuncia a las explicaciones largas y a los comentarios, prefiriendo los cuadros que resultan suficientemente expresivos por sí mismos. El que ocupa las páginas 6 y 7 permite localizar en un momento el o los valores que se atribuyen a los signos. Hasta la z, los signos no tienen más que su valor alfabético; pero después algunos tienen doble y hasta triple significado: ç-ieu, à-oin, etc. (sic). La raya lisa ha desaparecido y los signos de puntuación se representan igual que en la actualidad. Más adelante (p. 18), se dice cómo se han de representar las cifras, las cuales, de acuerdo con una regla ya en germen, según hemos visto, en el sistema de 1829, se representan por los signos de la primera serie precedidos del que hoy llamamos numérico. Si los signos matemáticos no son exactamente los que los ciegos utilizan en nuestros días, eran bastantes para cubrir las necesidades de la aritmética y el álgebra elemental." (Henri, 1988: 54). Sobretudo o método do relevo linear e o sistema de Braille conviverão juntos por algun tempo, em publicações que ainda podem ser consultadas na Biblioteca Valentin Haüy. Cabe ainda uma indagação com respeito a essa "epigênese" do seu sistema. Uma indagação de ordem ontológica, científica, cognitiva: Que elementos poderiam ter alimentado a inventividade de Luís Braille, além dos já referidos, permitindo-lhe a criação, com pouco mas dequinze anos vividos, do únnico meio natural de leitura e escrita dos cegos existente e atual até nossos dias? Em que pese as dificuldades para a leitura e a escrita na escola de Haüy, seus alunos realizavam diversas atividades manuais, e recebiam conhecimentos em diversas disciplinas. Luís Braille parecia se destacar na maior parte desses estudos, conforme relata Henri (1988: 37): "...Aplicado, intelígente, ha bilidoso, pronto se hizo notar en todas las ramas de lo que allí se ensenaba. Gracias a Pignier tenemos la lista de las recompensas que ganó entre 1820 y 1828, y vemos que aparece mencionado sucesiva o simultáneamente en el palmarés por el punta, la confección de escarpines de orillo y de trenza, la gramática, la historia, la geografía, la aritmétíca, la retórica, el curso de ampliación, la gramática general y lógica, el álgebra, la geometría, el violancelo y el piano. Toda esta nomenclatura pone de manifiesto la variedad de las aptitudes de Luis Braille, pero igualmente nos hace ver el carácter un tanto superfícial de las ensenanzas que allí se seguían dando entonces, apesar de las conclusiones presentadas al respecto por dos sabios eminentes: el matemático y astrónomo Jacques Binet y el arqueólogo JeanAntoine Letronne, a quienes Pignier había consultado". Nos limites desse ensaio, não poderia ir mais longe na investigação dessa questão, mas é certo que Braille soube sacar proveitos dos rudimentos ali ensinados, engendrando o mais perfeito diálogo entre pontos em relevo e o espaço vazio, para compor a gramática do seu sistema. Compreender a gramática do método de Braille, estabelecer a qualidade do seu sistema, será pois alvo do meu esforçoa seguir. Notas 1. Ver a esse respeito, Belarmino, Joana. "Associativismo e Política: A Luta dos grupos estigmatizados pela Cidadania Plena"(capítulo I). 2. Os teóricos da escola semiótica de Tártu criaram o termo "modelização secundária" para definir o que chamaram de "mecanismo semiótico da cultura", que, através da prática de indivíduos ou de coletividades, engendra "modelos" de codificação, recodificação e descodificação das "vagas" de informação emitidas pelo cosmos. Quando digo que o braille é um "sistema de modelização", refiro-me à essa interface de tradução da escrita convencional nessa nova estratégia que gerou a escrita pontilhada dos cegos. 3. Pignier é um dos mais importantes biógrafos de Luís Braille citado por Pierre Henri. 3. SEIS PONTOS DE UMA REVOLUÇÃO SISTÊMICA Você tem um texto braille à sua frente e deixa que sua mão aberta passeie ao acaso pelo papel. Uma senssação de aspereza estimula sua pele e nada mais. Aí você experimenta olhar para o texto e a princípio não vê se não um emaranhado de pontos, que ora podem assemelhar-se a um labirinto, ora lembram um bordado abstrato, ora uma pauta musical, ora parecem sugerir flores ou pequenos peixes. Como num jogo de quebra-cabeça você pode se perguntar: Qual é a senha ou a chave que me fará acessar a lógica desse jogo? Aqui a pergunta a ser feita não é exatamente essa: Aqui, importa-nos saber, quando é que o código braille fez sentido, convertendo-se num alfabeto? Importa-nos estabelecer, quais os elementos primordiais do sistema braille, em que tipos de relações eles se combinam a fim de que o código possa ser entendido como um sistema? Será necessário pois, uma breve definição do conceito de Sistema. Desde Copérnico, são várias as tentativas no sentido de se chegar a uma formulação precisa para o conceito. A mais usual adota a idéia de sistema como um agregado ou reunião de coisas, relacionadas entre si. Adotarei o conceito proposto por Uyemov, que considera que "um agregado (m) de coisas (qualquer que seja sua natureza) será um sistema S quando por definição existir um conjunto de relações R entre os elementos do agregado de tal forma que venham a partilhar propriedades P" (Uyemov, 1975: 96, op. cit. por Jorge Albuquerque Vieira, em texto xerocopiado). Qual é a vantagem dessa definição? ela introduz o conceito de propriedade, e mais ainda, o conceito de propriedade coletiva partilhada, que é uma propriedade que só faz sentido no todo, e não na parte; ou seja, os elementos que constituem o sistema podem ter suas propriedades também enquanto indivíduos, o que significa que os indivíduos também são sistemas; no entanto, quando eles se juntam, a coletividade permite a emergência de uma propriedade nova, uma propriedade que você não encontra no indivíduo. Para que alguma coisa seja considerada "sistema", será necessário apreciá-la a partir de alguns parâmetros propostos pela corrente sistêmica de pensamento. Em Teoria dos Sistemas pode-se falar em "parâmetros sistêmicos básicos ou fundamentais",1 e "parâmetros sistêmicos evolutivos.2 É para alguns dsparâmetros evolutivos que voltarei pois meu interesse, trabalhando sobretudo com as idéias de "conectividade, "integralidade e "gramática", para a partir dessa tripla ordenada, caracterizar o alfabeto braille como um sistema. 3.1. PENSANDO O BRAILLE COMO UM SISTEMA o que teria feito disparar o sistema braille? quais as suas propriedades agregadoras? Eis-me novamente em umterreno escorregadio, mas pleno de possibilidades. Meu breve panorama com respeito aos métodos primordiais de leitura e escrita dos cegos demonstrou quão difícil se fazia a caminhada desses indivíduos nesse terreno. me parece que uma das primeiras propriedades agregadoras que propiciou o surgimento do sistema braille foi a necessidade de permanencia desses indivíduos na cultura, no mundo. Mas uma permanecia que se desse com qualidade, com ampliação e refinamento do unwelt do grupo.Os mecanismos evolutivos, aliados à toda a têia dos acontecimentos cotidianos imersos em um dado contexto, fizeram com que aparecesse o lider, o criador, o construtor dos fios e conexões que engendrariam de uma vez por todas, a solução qualitativa para esse refinamento. Se de novo olharmos para a "epigênese" do sistema braille, veremos que o novo alfabeto não surgiu do nada, mas aproveitou o essencial da estratégia proposta por Charles Barbier, ou seja, a substituição do traço pelo ponto. Braille foi muito mais além. deu-nos uma lição de eocnomia, lógica, eficiência matemática, eliminação do ruído e otimização na descodificação da informação. enquanto que na estratégia sonográfica de Barbier, havia doze pontos para as combinações, que carecia de um quadro para simbolizar a fonética da língua francesa, Luís Braille instituiu uma estratégia cuja célula básica se compõe de seis pontos, gerando ordinariamente 64 combinações, criando um alfabeto autônomo, apto a representar a escrita convencional, a musicografia, a matemática, entre tantas outras possibilidades. É preciso no entanto, avaliar esse código do ponto de vista das suas propriedades fundamentais: Porque será que o sistema braille fez sentido? Porque será que em tão pouco tempo converteu-se no único meio natural de leitura e escrita das pessoas cegas? A resposta a essas questões demonstra a capacidade do sistema, para aquilo que estou chamando de refinamento do unwelt da coletividade cega. a solução proposta por braille propiciou um diálogo perfeito entre a sua célula e a percepção tátil. É sobretudo no ato da leitura, do qual falarei mais adiante, que se percebe esse perfeito ajustamento entre os dois sistemas. Por agora, enfatizarei o que já frisara: o tamanho das letras, aptas a serem percebidas pela polpa do dedo, permitiu a leitura sintética e ágil, em detrimento de uma leitura penosa, detendo-se a analisar curvas e traços. E assim vemos emergir uma outra qualidade do braille: a de propiciar uma mudança de movimento no tempo e no espaço; a de garantir maior mobilidade e eficiência ao seu canal de percepção: o tato. Não tem sido assim com a maioria dos processos evolutivos? A vida não ganhou em qualidade e evolução a partir de estratégias associadas à qualidades de movimento na exploração do espaço? Por baixo dessa análise de questões mais objetivas, pululam possibilidades de questões outras, ainda virgens de uma pesquisa: para além do refinamento do unwelt sócio-cultural dos indivíduos cegos, o que o sistema de Braille estará fazendo com seu unwelt biológico? Que tipos de sinapses e conexões comparecem nos newcórtex desses indivíduos, quando se realiza esse movimento mágico entre mão e cérebro, descodificando a cultura letrada? O sistema braille atende pois, a um parâmetro fundamenal que parece presidir todos os sistemasvivos, ou àqueles subsistemas que interagem com o "vivo", ou seja, o parâmetro da permanência. Prosseguindo com aanálise, Posso dizer que em princípio estou lidando com três sistemas distintos: o sistema da percepção tátil, o sistema da escrita convencional e a matriz básica dos seis pontos braille. Mas é para este último que voltarei minha análise agora. Imagino a célula braille como aquele agregado M de elementos, um conjunto finito de seis pontos justapostos, apto a realizar séries finitas de relações /conexões R, em função de um conjunto P de propriedades e objetivos previamente estabelecidos. Nesse processo, institui-se um primeiro diálogo entre os pontos do relevo e o espaço em branco no papel. Isto porque as combinações/relações pensadas por Braille realizam-se em função das posições dos pontos da célula. É assim que a série primordial pode ser subdividida em séries menores, de acordo com essas posições, A série 1, composta pelos três pontos da direita; a série 2, composta pelos três pontos da esquerda. Mais três séries de signos podem ser combinadas, levando-se em conta a posição "cima", composta por dois pontos signos; a série "meio", composta por dois pontos signos; a série "baixo", também composta por dois pontos signos. é claro que certas relações são possíveis, outras não; esse é um aspecto fundamental nessa visão sistemica; dada a possibilidade de um conjunto r de relações, certas relações são permitidas, outras não. Uma análise cuidadosa das combinações criadas por Braille para a representação das letras no seu alfabeto revela uma preocupação em eliminar ambiguidades para a percepção tátil, "ruídos" que pudessem dificultar o fluxo da informação/descodificação das mensagens. A esse respeito Henri relata: "...Actuando sin saberlo como primeiro psicólogo de la edificación de las estructuras táctiles, desechó todo signo que pudiese prestarse a confusión con otro, y sólo conservó para formar su serie fundamental las combinaciones que hacían bajo el dedo imágenes claras. Y assí desechó los signos que hemos numerado, 3, 4, 6, porque aislados podían confundirse entre sí y con el signo 1".(Henri, 1988: 56).3 Esse conjunto de relações R permitidas, ao lado de uma espécie de seletividade de algumas relações mais apropriadas à percepção tátil nos fazem pensar naquela idéiade uma gramática presente no sistema braille, uma gramática que parece estar alimentada por "conexões ativas", "enlaces" entre determinados elementos, no sentido que é dado aos termos por Mário Bunge, que define "conexão" como uma relação mais forte, ou seja, trata-se de uma relação logicamente representada, envolvendo os elementos a e b, onde a age sobre b, a ponto de poder mudar a história deste último. Pode-se dizer então, que essas conexões entre o relevo e o espaço em branco, criando diferentes possibilidades de combinações dos pontos entre si, geram "informação", porque geram a "diferença" que estimula o canal de percepção tátil, compondo assim o diálogo entre este canal e o sistema sensório/motor do indivíduo cego leitor. Se de acordo com a concepção sistêmica, gramática implica em relações, o que significa que está fundada na associação de signos, a qual permite determinadas combinações e proíbe outras, propicia assim que determinados arranjos ou sistemas sígnicos comecem a emergir; se diz então que todos esses arranjos desses signos que podem emergir são "mensagens". Ora, o código braille, permitindo um alfabeto ordinário de 64 combinações a partir dos seis pontos justapostos, 4 compõe em sua gramática, uma primeira mensagem contida na representação das letras do alfabeto convencional. relações outras, combinando letras e pontos, forjam mensagens outras, para a representação matemática, a simbologia algébrica, a notação musical, a estenografia braille.5 Para o desenho e a cartografia, o relevo pontilhado dá o tom de uma nova mensagem, onde parece que de algum modo se recupera a idéia básica da escrita convencional, fundada no traço e na curva. Cabe afirmar então, que se o sistema braille exibe uma gramática, com seu conjunto de mensagens M, ele pode ser percebido no seu todo, e nas múltiplas relações que estabelece entre seus subsistemas, como uma "linguagem". Se há pois uma dupla ordenada, caraterizada por uma gramática com propriedades partilhadas e objetivos previamente estabelecidos, e uma linguagem, torna-se evidente um outro parâmetro sistêmico, ou seja, o parâmetro da "integralidade", que prevê a emergência de subsistemas advindos das relações entre os elementos do sistema. Falar pois de uma gramática com propriedades partilhadas significa falar de uma gramática que produz certas mensagens como subsistemas; o que significa que podemos dizer que o alfabeto braille é um sistema, na medida em que tem a sua estrutura fundada em um número finito de relações, uma gramática com propriedades partilhadas, sendo por definição, uma linguagem. 3.2 O INDIVÍDUO CEGO LEITOR: UMA LIÇÃO DE RETROALIMENTAÇÃO? Embora Braille não houvesse estudado cibernética, teoria da informação, ou mesmo teorias de sistemas, campos de conhecimento que àquela época se quer haviam sido pensados, o seu código parece estar sintonizado com o espírito de um tempo em que linguagens binárias estavam na base de inúmeras invenções, revolucionando inclusive o próprio fazer científico. É curioso no entanto, como inúmeras ferramentas teóricas das ciências contemporâneas podem propiciar uma análise desse invento, aliando-o a todo esse conjunto de conhecimentos e de estratégias técnicas criadas pela humanidade nos últimos três séculos, ao mesmo tempo em que permitem focalizar o código braille em suas múltiplas nuances, permitindo-nos vislumbrar a complexidade de uma matriz de seis pontos, que cresce e se alarga em relações aptas a modelizar e ampliar o universo das inúmeras representações da cultura letrada. Desejaria pois, lançar uma última idéia ilustrativa de como o código braille pode ser pensado à luz desses novos campos de estudo. Para tanto, será necessário tecer algumas considerações sobre o ato da leitura em braille. Estudiosos da alfabetização através do sistema braille têm afirmado que os melhores leitores desse sistema são aqueles que se alfabetizaram num período entre os seis aos onze anos de idade. Consideram ainda, que esse desempenho ótimo se dá quando esses leitores se utilizam das duas mãos para descodificar cada linha braille. Ora, é sobretudo no ato da leitura que se configuram o processo de descodificação das mensagens, se quisermos, o fluxo de informação entre o aparelho sensório-motor do indivíduo e a interface braille. O fato do uso das duas mãos qualificar e otimizar o ato da leitura me faz pensar no conceito cibernético de "realimentação ou feedback", proposto por Norbert Wiener, para descrever o desempenho ótimo de máquinas, mas que se presta perfeitamente a ser aplicado em outros sistemas. Segundo Wiener, "...Tal contrôle da máquina com base no seu desempenho efetivo em vez de no seu desempenho esperado é conhecido como realimentação (feedback) e envolve membros sensórios que são acionados por membros motores e desempenham a função de detectores ou monitores - isto é, de elementos que indicam um desempenho. A função dêsses mecanismos é a de controlar a tendência mecânica para a desorganização ; em outras palavras, de produzir uma inversão temporária e local da direção normal da entropia. (Wiener, 1993: 23) De fato, no ato da leitura pelo indivíduo cego, o trabalho da primeira mão é o de identificar cara caracter da linha braille, identificando assim o conjunto de letras, sílabas e palavras. O trabalho da segunda mão, percorrendo o mesmo caminho da primeira, é o de certificar-se e mesmo "controlar" esse desempenho, combinando a esta uma outra estratégia: A de evitar que o indivíduo perca-se na leitura, embaralhando as linhas no seu passeio tátil. Por experiência própria observo que no ato da leitura, a segunda mão estaca sempre a meio caminho da linnha descodificada pela primeira e recomeça seu "trabalho" de direcionamento e controle na linha seguinte, seguindo assim por todo o texto. É importante frisar que aqui se evidencia um "modelo horizontal" de comunicação, na medida em que os papéis de "leitora" e "controladora" são intercambiáveis entre as duas mãos, quando se observa o processo de leitura passo a passo. Nesse simples mecanismo de aparente "trabalho manual", não poderia estar implícito um diálogo entre mão e cérebro, se quisermos, troca de energia e de informação entre terminações neurosensório-motoras e a interface braille? Não seria esse o lócus privilegiado para a apreciação das múltiplas sinapses e conexões que se realizam nesse processo de transporte de informação? Pensar no braille, estudar o braille, é pois um desafio fascinante, que nos remete a inúmeros caminhos. Se a Teoria Geral dos Sistemas é um excelente caminho de atualização desse código, hánele toda uma "semiose" a ser apreciada pela ciência dos signos. Depois do braille, todo um novo campo de perspectivas de análise abre-se à nossa frente, ou seja, o campo dos avanços tecnológicos na área da cegueira. eSTARÁ SE INSTITUINDO NO CÍRCULO DA EDUCAÇÃO DE CEGOS, UM RETORNO À "EDUCAÇÃO ORAL", COM BASE NAS INTERFACES DE VOZ SINTÉTICA e da imaterialidade da letra através dos processos de digitalização do braille? Nos limites desse ensaio, somente há que se colocar um ponto final, à guiza de conclusão, que será também um ponto de partida para futuros aprofundamentos. Notas 1. Os parâmetros básicos ou fundamentais são aqueles que se pevê encontrar em qualquer sistema vivo, independentemente do seu estad no tempo e no espaço. São três, de acordo com a classificação deMário Bunge: A permanência, o ambiente e a autonomia. 2. Os parâmetros evolutivos dizem respeito à evolução do sisema. São: Composição, Conectividade, Estrutura, Integralidade, Funcionalidade e Organização. (ibd.) 3. Para o aprendizado do código braille, a série da direita é nomeada pelos números 1, 2 e três, enquanto que na série da esquerda os pontos são nomeados por 4, 5 e 6. 4. Em alguns trabalhos são citadas ordinariamente 63 combinações. Matematicamente se diz que são 64 combinações, visto que a combinação zero também é contemplada, ou seja, no caso do código braille, a célula vazia, que corresponde ao espaço entre as palavras também é computado como um tipo de combinação. 5. A estenografia braille ou braille abreviado tem sido usada como estratégia para economizar papel na impressão braille. Esse subsistema mereceria uma análise a parte, dadas as discussões que tem suscitado, assim como as múltiplas combinações previstas, entre pontos isolados, conjuntos de letras, compondo as abreviaturas. CONCLUSÃO E eis que retorno ao ponto de partida, experimentando ainda nas mãos, aquela senssação de haver desfiado perguntas, ao modo da longa meada azul desfiada em tantas direções, que levara Saramago a tecer o caminho da sua "Jangada de Pedra" até Maria de Guavaíra. *** O início do século XXi evidencia uma nova viragem nas estratégias de produção, estocagem e distribuição da informação também no âmbito da "cultura tiflológica", a qual se iniciou a partir dos anos 80 do século passado. Estudiosos do sistema braille têm alertado para uma espécie de "desbrailização", ou de uma su-utilização do meio natural de leitura e escrita dos indivíduos cegos. Estaríamos diante de uma "crise" que poderá vir a caracterizar um novo "momento" da evolução dessa história? Que formas de "acoplamentos" e "integrações" estarão se forjando dentro deste cenário em que se verifica um múltiplo diálogo entre as interfaces tecnológicas e as formas tradicionais de produção, estocagem e distribuição da informação, nos seus vários níveis? Para que se compreenda a vastidão dessa questão, é necessário pois que se realize o esforço de olhar para a recente história do código braille, sob o foco das visões sistêmicas e semióticas, as quais deságuam necessariamente no campo da informação e da comunicação. As páginas desse ensaio foram o "lugar" provisório de onde iniciei o meu próprio esforço, limitado e particular nesse sentido. Muito do que aqui abordei está ainda em fase de "proto/experiência", exercício de fazer perguntas, estabelecer conexões, escavar as formas de relações presentes entre essa história e a cultura onde ela está sendo gestada. E uma "imagem" última me ocorre agora e o meu cérebro forja dedos ínvisíveis que a examinem. Essa história assemelha-se mesmo ao novelo azul de Maria de Guavaíra. Mas um novelo que perdeu sua forma bojuda, e cresce estranhamente, arredondando-se em alguns pontos, sutilizando seu tecido de linha em outros, alrgando-se aqui e ali, em múltiplas ramificações. Um novelo que é um todo e suas partes, a tecer suas relações e criar o complexo. Pois falar de sistema braille é falar cdo complexo, é tocar no primordial da essência humana, com dedos que"assinam" no mundo a sua forma de visão. (***) Alusão ao romance do escritor português, José Saramago, "A Jangada de Pedra". REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS - Belarmino, Joana. "Associativismo e Política: A Luta dos Grupos Estigmatizados pela Cidadania Plena", Editora Idéia, João Pessoa/ Pb, 1997 - . "O que Vê a Cegueira?" Revista Benjamin Constant, no 18, Agosto de 2000 - Bunge, Mário. La Investigacion Cientifica. 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