MATEMÁTICA PARA DEFICIENTES VISUAIS: Nossa Habilidade em Resolver Problemas



O tempo passa e o homem tenta buscar soluções, ainda mais óbvias, para os problemas... Não me refiro aqui aos problemas do dia-a-dia, como organizar a agenda, enfrentar um congestionamento, arrumar a casa, cuidar dos filhos, negociar dívidas ou cronometrar o tempo para dar conta de realizar todas as tarefas pendentes ou rotineiras. O fato, no entanto, seria resolver de forma mais simplificada aqueles problemas absurdos, os quais fazem parte dos dias letivos de qualquer escola. Talvez a falta de objetividade do ensino da matemática que a torna tão fantasmagórica entre a maioria dos estudantes. Por isso, mesmo não sendo nenhuma especialista no tema em questão, decidi abordar a matemática, sobretudo como tal disciplina pode ser encarada de forma mais suave, principalmente no trabalho com deficientes visuais.
Sabemos que na falta da visão, quem entra em ação são os sentidos latentes, que precisam ser estimulados e valorizados no momento do aprendizado, buscando superar as limitações. Para isso, muitas vezes não é possível fazer abstrações. A princípio elas não têm um significado, já que só podemos abstrair daquilo que já representa um conceito formulado, dispondo de referências e interpretações próprias às experiências. Utilizar jogos em relevo, materiais concretos, referências e associação a outras situações de relevância pode ser uma boa saída para que a matemática surja como um momento de descobertas prazerosas para o deficiente visual. Importante lembrar que, durante todo o processo de ensino/aprendizagem da matemática o uso do soroban é essencial, não apenas como registros mas, acima de tudo, para dar igualdade de oportunidades a todos os alunos, sem que para isso, o cálculo mental seja a única alternativa. Antes do uso do soroban para o ensino da matemática entre os deficientes visuais, suas ações eram restritas a memorização, cuja estratégia de cálculo mental os excluía as possibilidades de resolução dos problemas em provas, concursos, vestibulares. Hoje a utilização dessa técnica, aliada ao sistema Braille merece grande destaque quanto sua funcionalidade e aplicação, o que resultou na publicação de uma portaria nº. 1.010, do Ministério da Educação, de 11/05/2006, instituindo o soroban, contador mecânico adaptado para pessoas com deficiência visual, nos sistemas de ensino do País em todos os níveis.
O soroban, aparelho de cálculos usado há muitos anos no Japão, pode ser considerado uma máquina de calcular de grande rapidez, permitindo registros e operações de forma mais simples. Sua principal vantagem está na escrita de números, sendo um dos métodos ideais para o ensino da matemática aos deficientes visuais. Com ele os alunos aprendem concretamente os fundamentos da matemática, as quatro operações, as ordens decimais e seus valores, e até cálculos mais complexos. Este recurso favorece a integração e interação entre os alunos cegos e de visão normal, pela possibilidade de acompanhar o ritmo das atividades desenvolvidas em classes comuns e no dia-a-dia.
Ao contrário das calculadoras, cujos resultados são automatizados, o soroban permite um cálculo mecânico, em que os resultados dependem, exclusivamente, de todo o processo. Sendo assim, qualquer falha durante a execução resultaria em erros. Por outro lado, o soroban por si só não resolveria todas as pendências de uma matemática mal conduzida. Para tornar-se um método eficaz, sua utilização precisa aliar-se ao código Braille e suas particularidades.
O Código Braille criado em 1825, na França, por Louis Braille, veio quebrar a barreira da acessibilidade do deficiente visual a escrita convencional e, desde então tem sofrido alterações a fim de aprimorá-lo e abranger cada vez mais representações. Assim em 1997 surgiu o código unificado de matemática, cujas últimas alterações feitas em 2003 trouxeram ainda mais possibilidades, inclusive representações para geometria, e cálculos mais elaborados.
Uma atitude muito comum entre os profissionais, na tentativa de ensino da matemática para os deficientes visuais seria, as exigências da semelhança entre o que se escreve em tinta para o Braille, como por exemplo, os algoritmos... Como montar e realizar uma operação em Braille? Essa semelhança só afastaria as possibilidades de uma resolução bem sucedida e, justamente para suprir essa lacuna, as estratégias alternativas entram em ação. As atividades podem e devem ser anotadas em Braille, obedecendo a suas especificidades: as expressões sempre na horizontal, pois a movimentação das mãos, a disposição da informação no papel, tanto na escrita quanto na leitura influenciam, de forma significativa, a compreensão e execução da atividade proposta. Acompanhar as anotações para executá-las em outro plano, utilizando soroban, jogos em relevo, materiais adaptados, é a garantia da qualidade do processo.
Uma das melhores alternativas de trabalho que pode ser realizada paralelamente ao uso do Braille e do soroban tem sido o material dourado, por permitir uma compreensão mais concreta das operações, quantidade, trocas, e, por proporcionar um contato mais direto e uma mobilidade entre as peças. Desenhos com contornos em relevo, peças de dominó, dados, cartelas de bingo, lousas magnéticas, e até mesmo formas que representam a “cela” Braille são possibilidades ricas a serem exploradas, reforçando o fato de estarem todas em relevo ou com cores contrastantes, no caso de baixa visão. Assim podemos fazer da matemática um momento para explorar não apenas seus “problemas”, mas oferecer uma solução muito mais harmoniosa e compatível a cada realidade, partindo das adaptações para cada necessidade e situação.

Luciane Molina


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